sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

welcome bienvenido bienvenue willkommen

Olá :)

Aqui encontrarão uma miscelânea cujo tema central será quase sempre a parentalidade. Eventualmente dir-se-ão coisas mais íntimas e outras mais generalistas. Ao experimentar a sensação do desconhecido nos meandros da infertilidade e da adopção, fomos sentindo necessidade de contactar com outras realidades. Entretanto, começámos este blog em modo privado (só a dois), devagarinho fomos convidando amigos a lê-lo e agora sentimo-nos preparados para a abertura ao público. Pensámos que talvez a partilha que sentimos chegar até nós através de outros blogs seja também aqui encontrada por outras pessoas. 

 Sejam bem vindos e que o vosso dia seja, de facto, limpo. 

Cipreste,digamos que é a futura mãe 
Chaparro, já é pai, do Freixo 
Freixo, um adolescente cheio de Swag
Sonhamos, todos os dias. Ansiamos por acordar, todos os dias. É isso. E o que lemos e procuramos, não nos dirá a parte ínfima, do que vai ser. Um dia vamos acordar e vai ser o dia.

E outros dias se seguirão. Não será o começo de nada, mas a continuação.


Chaparro

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

O enxoval.

Percebo que a minha vida tem sido muito feita de enxovais que não chegam a ir com a noiva. Nesta óbvia distorção do ditado popular, o que eu quero dizer é que, não obstante ter alcançado muitos objectivos nos últimos anos, outros houve que ficaram pelo caminho. Por exemplo, em 2011, preparámo-nos para zarpar até às Áfricas mas acabámos por ficar. No fim, constatamos que foi muito bom não ter ido, muita coisa aconteceu que poderia ter sido mais “fatal” se não estivéssemos cá. Entretanto, falámos e lemos muito sobre a vida de emigrante em Angola, ou Moçambique ou Cabo Verde. Serviu para a nossa cultura geral, pronto. 
2012 e 2013 foram anos com grandes sonhos de gravidez e cheirinho a bebé. Também lemos muito e iniciei-me na realidade dos grupos de entre-ajuda. Escrevi um pouco, não tanto quanto pensei fazer ou, pelo menos, quanto escrevi “mentalmente”. Embora fosse muito claro para nós que as probabilidades de uma gravidez eram baixas, e porque houve equipas dispostas a sujeitar-nos a tratamentos (isto são outros quinhentos) deixamo-nos sonhar. Decidimos que não íamos ficar presos ao grande número que indicava que não iríamos alcançar o sonho e voámos por momentos. Vestimo-nos de espírito positivo. Muito se falou aqui em casa de cheirinho a bebé, de enxoval, de nomes, da probabilidade de fazer uma gravidez gemelar, etc. Sonhámos. 

A verdade é que na gestação dos sonhos acabamos por falar muito de futuro. E, sinceramente, não me interessam as máximas que sugerem que é uma perda de tempo pensar no futuro. Ele existe enquanto preparação do nosso presente, portanto, não vale a pena negá-lo. E, neste momento, o nosso grande futuro é a adopção, não há lugar a dúvidas quanto a isso. Entre a incerteza que é hoje inerente a um casal em que ambos são empregados com vínculos sem termo, nem assim conseguimos viver descansados quanto à capacidade para manter uma casa que foi comprada dentro das regras de esforço das famílias, entre a incerteza quanto à saúde dos nossos entre-queridos (e a nossa, já agora…), o bem estar do Freixo, etc., entre todas estas preocupações e vivências paira a adopção como o maior tema das nossas vidas.
Já provocámos algumas mudanças na nossa casa a contar com a adopção, mesmo compreendendo que pode ainda passar muito tempo até que esta aconteça. A parte prática do meu ser resolveu que mais vale perder tempo com determinadas alterações agora do que no momento em que subitamente nos surge uma proposta e, num instante, temos a(s) criança(s) em casa. E isto faz sonhar. E falamos muito. E verbalizamos situações hipotéticas do dia-a-dia. Sonhamos. Como não fazê-lo?

Por vezes, a parte mais magoada de mim diz-me: pára com isso. E converso comigo sobre todos os sonhos de ser mãe que já passaram por mim desde 1997 e, no limite, penso que nada disto se vai concretizar porque… nada disto se vai concretizar para mim, porque me está destinado não ser mãe. E depois choro. E depois trago-me de novo à razão e explico-me que também tenho uma palavra a dizer em relação ao meu destino. E volto a acreditar e desculpabilizo-me por querer fazer um enxoval.

A verdade é que há muito passado neste sonho e, por vezes, é preciso fazer um grande exercício para não deixar que as derrotas residam no presente (e que tomem conta dele). E assim se cumpre a luta do bem-querer. É preciso que não nos esqueçamos, e mesmo quando nos distraímos é preciso regressar depressa ao presente e às pessoas que junto connosco estão a construir os dias.

O tempo é um grande fantasma, mas não vejo como não viver com ele porque, por um lado, há coisas que nunca quero esquecer e, por outro, nada faz mais sentido do que sonhar com os meus filhos e fazer-lhes o enxoval.

Já temos:

- 2 fronhas bordadas a dizer “good night” - sim, também vamos ser anglófonos

- as 2 mantas-mais-fofinhas-do-mundo - são as prendas do Natal 2013 do pai e da mãe

- um mocho - feito pela tia Ana que o deu à mãe mas que a mãe já pôs no nosso quarto

- e hoje a mãe vai comprar duas molduras iguais às dos avós e das tias, uma cá para casa e outra para o Freixo - para pôr a nossa primeira fotografia


Cipreste

da boca dos outros


  My little one swings about with his emotions and behaviors.  I remember with my older son went through these times when he was unruly and slept poorly and then a week or so later he would burst forth with a new skill or more words in his sentences.  It was then I knew how hard a little brain works, perhaps practicing how to make sentences, and how it all at once stimulates and exhausts a little person.  When I think of Andu and count off the months he has in our home, fifteen, I can't help but notice how much heavier his load is than a child who is born into a family and is with them from birth.  While he is plotting about how to make sentences and let others know his mind through his voice, he is also learning trust and attachment and love.  This is a challenge for anyone of any age.  Little kids are so vulnerable.  They literally have no choice but to depend on others.

Last week was difficult.  Lots of foghorn-crying, acting out, hitting, and rascally attention-seeking behavior.  I would look on in amazement at the child who had come so far act not at all like himself, pushing me away.  The saddest thing happened, too.  I was holding him, his face to mine, struggling to get some article of clothing on, and he slapped me hard, really hard, on the face.  It was so hard that I was shocked into silence and must have been wide-eyed when our eyes met.  He hadn't really been mad at me, but that hitting had become so much a part of his behavior, that he just did it.  He hadn't even been looking at me when it happened.  But, he knew its effect, I could see that in his eyes.  He looked terribly sad, almost in tears.  His eyes were pleading.  And I said, there's no hitting, followed quickly by, you're okay.

Now the past few days he is so little suddenly.  All that brashness, that behavior that invites you to be annoyed and withholding of praise, is gone.  In place of the hellcat is a baby, so little.  He is a shadow, never more than a few feet from me.  He is cuddly and insists on holding hands.  He just gets so "little."

I don't know the secret to parenting.  I don't know what to do so much of the time.  So I just stay present.  The days are long, but the years are short.  Have to just stick with the little ones, be present, stick close.

Posted by Christine @Mother Paradox

sábado, 21 de dezembro de 2013

"Acreditar é a grande lição", disse-me um dia o meu amor

Coisas do dia-a-dia: «- O Sr. Dr. deixa o meu marido ir passar 3 dias a casa pelo Natal. Ele ficou muito feliz, disse-me “Pronto, vou a casa pela última vez e depois venho aqui acabar os meus dias”. Sabe, fomos muito felizes durante 42 anos e nunca quisemos que nos escondessem nada. Então, eu disse-lhe “-Vês, amor, ainda voltamos a dormir juntos. Nós dois.”.»

20 de Dezembro - continuar a acreditar, contigo


Cipreste

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

da boca dos outros (listas!)

An Adoptee’s Perspective: 10 Things Adoptive Parents Should Know

1. Adoption is not possible without loss. Losing one’s birth parents is the most traumatic form of loss a child can experience. That loss will always be a part of me. It will shape who I am and will have an effect on my relationships—especially my relationship with you.

2. Love isn’t enough in adoption, but it certainly makes a difference. Tell me every day that I am loved—especially on the days when I am not particularly lovable.

3. Show me—through your words and your actions—that you are willing to weather any storm with me. I have a difficult time trusting people, due to the losses I have experienced in my life. Show me that I can trust you. Keep your word. I need to know that you are a safe person in my life, and that you will be there when I need you and when I don’t need you.

4. I will always worry that you will abandon me, no matter how often you tell me or show me otherwise. The mindset that “people who love me will leave me” has been instilled in me and will forever be a part of me. I may push you away to protect myself from the pain of loss. No matter what I say or do to push you away, I need you to fight like crazy to show me that you aren’t going anywhere and will never give up on me.

5. Even though society says it is PC to be color-blind, I need you to know that race matters. My race will always be a part of me, and society will always see me by the color of my skin (no matter how hard they try to convince me otherwise). I need you to help me learn about my race and culture of origin, because it’s important to me. Members of my race and culture of origin may reject me because I’m not “black enough” or “Asian enough”, but if you help arm me with pride in who I am and the tools to cope, it will be okay. I don’t look like you, but you are my parent and I need you to tell me—through your words and your actions—that it’s okay to be different. I have experienced many losses in my life. Please don’t allow the losses of my race and culture of origin to be among them.

6. I need you to be my advocate. There will be people in our family, our school, our church, our community, our medical clinic, etc. who don’t understand adoption and my special needs. I need you to help educate them about adoption and special needs, and I need to know that you have my back. Ask me questions in front of them to show them that my voice matters.

7. At some point during our adoption journey, I may ask about or want to search for my birth family. You may tell me that being blood related doesn’t matter, but not having that kind of connection to someone has left a void in my life. You will always be my family and you will always be my parent. If I ask about or search for my birth family, it doesn’t mean I love you any less. I need you to know that living my life without knowledge of my birth family has been like working on a puzzle with missing pieces. Knowing about my birth family may help me feel more complete.

8. Please don’t expect me to be grateful for having been adopted. I endured a tremendous loss before becoming a part of your family. I don’t want to live with the message that “you saved me and I should be grateful” hanging over my head. Adoption is about forming forever families—it shouldn’t be about “saving” children.

9. Don’t be afraid to ask for help. I may need help in coping with the losses I have experienced and other issues related to adoption. It’s okay and completely normal. If the adoption journey becomes overwhelming for you, it’s important for you to seek help, as well. Join support groups and meet other families who have adopted. This may require you to go out of your comfort zone, but it will be worth it. Make the time and effort to search for and be in the company of parents and children/youth who understand adoption and understand the issues. These opportunities will help normalize and validate what we are going through.

10. Adoption is different for everyone. Please don’t compare me to other adoptees. Rather, listen to their experiences and develop ways in which you can better support me and my needs. Please respect me as an individual and honor my adoption journey as my own. I need you to always keep an open mind and an open heart with regard to adoption. Our adoption journey will never end, and no matter how bumpy the road may be and regardless of where it may lead, the fact that we traveled this road together, will make all the difference.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Ir aos livros ou não ir aos livros? Eis a questão.

Quando sonhava ser mãe biológica tinha como plano não ler livros de puericultura, pedagogia e o diabo a sete. Embora reconheça que sou profissionalmente formatada para a pedagogia, sempre achei que a educação deve ser uma coisa natural, algo que acontece e não precisa de teorias. Esta convicção nunca se baseou numa negação dos saberes da pedagogia, mas antes baseava-se numa postura que assume que, com ou sem livros, serão sempre cometidos erros. Sabemos que todos temos convicções e certezas que caem que nem castelos de cartas quando chegamos à parentalidade. É óbvio que eu, ainda sem ter chegado lá, achava que as minhas são inabaláveis e que não vou engolir as minhas palavras. Somos assim e algo me diz que é saudável – tanto o facto de termos convicções (para disfarçar dúvidas e incertezas) quanto a realidade de ter de as deitar pelo chão na hora certa (para reforçar convicções e certezas).

Portanto, eu dizia que quando sonhava ser mãe biológica tinha como plano não ler livros que me guiassem nesse caminho. Fiz o mesmo durante os tratamentos de fertilidade, quis saber apenas o essencial. Ainda não sei se esta postura é a mais saudável, mas suspeito que pelo menos é saudável porque se situa algures no meio-termo entre “esgotar a informação” e o “não querer saber”.

Agora com a adopção a coisa pia mais fininho. Ui. É um ver-se-te-avias de leituras. Leio de tudo, do bom e do mau. E vídeos! Há dias fui apanhar-me frente ao youtube a ver vídeos atrás de vídeos, sem qualquer tipo de lógica no clique seguinte. Já percebi que há conceitos que me são simpáticos como o therapeutic parenting e que há outros que considero puras aberrações como o attatchment therapy (brrr).
É um bocadinho cansativo querer “saber tudo”, mas não encontro outra forma de estar na adopção. Até começar a ler, não me era espontâneo nem automático compreender certos meandros do medo e da insegurança de uma criança adoptada, nem afianço que teria reacções pedagógicas como as recomendadas nestas situações. Pelo que só posso considerar que ler sobre o tema tem sido muito positivo para mim e, assim o espero, para o(s) meu(s) futuro(s) filho(s).

Uma das coisas que mais me faz sentir solidária com os pais adoptivos que tenho lido é mesmo isto: as escolhas conscientes nas reacções pedagógicas e o peso social que podem assumir. E é com isto que (mais) sinto que (mais) aprendo. Ou seja, há decisões que os pais adoptivos têm de tomar perante certas situações de conflito que por vezes são o oposto do preconizado (e aceite) socialmente, logo, muitas vezes criticado por família e amigos. Muitas vezes injustamente apelidado de paternalista e condescendente e os pais diminuídos a pais que permitem tudo só porque o filho é adoptado. E isto, curiosamente quando se trata do contrário: a reacção dos pais é muito reflectida e baseada no bem-estar do seu filho. 

Um exemplo: Suponhamos uma birra num lugar público.  Habitualmente, os pais biológicos sabem que os seus filhos sabem que o seu amor é incondicional e que os pais estarão ali para os proteger contra tudo e contra todos. Aquela coisa de que as crianças só têm coragem de dizer “não gosto de ti” às pessoas com quem estão emocionalmente seguras.
Portanto, durante a tal birra no lugar público, é mais ou menos consensual nos meios em que me movo o método “isso já te passa/ quem é este menino tão mal educado/ ficas aí? eu vou embora”.

O mesmo não acontece com as crianças adoptadas, e não estamos a falar apenas dos primeiros tempos “até à adaptação” (eu sei, são muitas aspas e parêntesis, tenham paciência). Do que tenho lido, quando sensíveis para certos processos das crianças, os pais adoptivos não reagem da forma descrita acima a uma birra dos filhos num lugar publico. Porquê? Porque geralmente os motivos por detrás da birra, embora em ambos seja basicamente a frustração, esta não tem origem nas mesmas causas e a forma como os pais reagem pode ajudar a superar esse momento ou a exacerbá-lo e até a introduzir novo um mau-estar na criança.

Continuando com o exemplo, quando uma criança adoptada faz uma birra a sua frustração pode estar minada com algo mais para além do que é natural nas limitações de se ser criança e não se poder fazer tudo o que se quereria fazer. Fazer uma birra pode não ter iniciado com esse objectivo mas pode muito bem ser uma forma de testar ali, no lugar público, o quão empenhados estão aqueles pais em serem seus pais. É agora, vou fazer uma birra tão má, mas tão má, que vais ver como sou horrível e vais ver se não me deixas aqui, vou provar como toda a gente, mais cedo ou mais tarde, me abandonará. E podemos acrescentar mais umas conclusões a esta teoria como porque sou mau e ninguém gosta de mim, não mereço um pai e uma mãe, etc etc. Sim, assim tão básico e a direito. Penso que é claro que reagir como descrevi acima com o método “isso já te passa/ quem é este menino tão mal educado/ ficas aí? eu vou embora” é completamente contraproducente do ponto de vista pedagógico numa situação destas. Porque se trata de uma emergência emocional. Porque, mais urgente do que ensinar boas maneiras, é urgente abraçar a criança e mostrar-lhe (se necessário dizer mesmo) que ninguém a vai deixar ali sozinha a chorar a sua frustração, as suas angústias, o seu medo de ser abandonado e de não merecer ser amado incondicionalmente, para além das boas e das más maneiras. Que, no fim do dia, volta para casa com o pai e a mãe.

~ ~ ~

E logo a mim havia de calhar ser mãe adoptiva. Eu, tão firme e hirta. Tão convicta da educação “rígida mas com amor” que fui dando aos sobrinhos. Só penso nos meus mais velhos que passaram tanto tempo comigo. Não digo que estivesse completamente errada, e é verdade que eles mostram muito amor por mim pelo que as memórias não devem ser más. Mas penso nisto que tentei explicar das reacções pedagógicas e chego à conclusão de que provavelmente ler não nos faz assim tão mal nem nos mina a naturalidade. Porque o que nos é natural é o amor e este não se aprende nos livros. E penso que o que se aprende nos livros é a travar e a modelar  as nossas reacções. Afinal, falamos de construções e essas estão lá, nos livros. E isso não me parece nada mal. Parar e respirar e, se necessário, contar até 10.

E depois, estas coisas não podem ser só aprendidas porque se leu num livro, têm de ser sentidas. Vou dar-vos um exemplo que vos pode parecer completamente parvo, mas não é. Eu sei que é bom porque não o li apenas, senti-o e foi por isso que o consegui concretizar.
O meu gato vai para 10 anos com 8kg de mimo. É um gatarrão filho único. Um doce que faz birras. De vez em quando passa-lhe pela cabeça que manda cá em casa e, de orelhas para trás, faz uns avanços de quem nos vai pôr na linha. Mas tem azar e costuma, er... costumava levar uma palmada que resolvia o assunto de uma (mão-)assentada só. Há tempos, estava eu a reflectir sobre esta coisa da história de alguns meninos adoptados e no quão assustador deve ser entrar na casa de estranhos para se tornar seu filho e eis que um pensamento leva a outro e me  veio à cabeça as palmadas que o Manjerico leva de vez em quando. Senti um calafrio ao imaginar um primeiro dia com uma provável birra do Manjerico a ser resolvida com uma palmada e a imagem com que a criança ficaria de nós: potenciais educadores pela palmada. Nem consigo descrever o quanto essa imagem me doeu. Falei com o Chaparro e resolvemos tentar mudar a nossa reacção pedagógica perante as birras do Manjerico. Adoptámos o método de lhe soprar no focinho quando o “não” não funciona, aprendemos esta com a Gi.
Começámo-nos a treinar para a não-palmada em Setembro e passados 2 meses e picos posso afiançar-vos que o sortudo do Manjerico deixou de levar palmadas e até faz menos birras (go figure!). Não digo que vá tentar aplicar teorias a torto e a direito, mas percebemos que esta era importante e sentimo-nos felizes e orgulhosos de ter concretizado isto.

O que eu quis dizer com este palavreado todo resume-se nisto que li há tempos: uma mãe a dizer que se tivesse tido os seus filhos adoptados antes dos seus filhos biológicos certamente que estes últimos teriam sido poupados a muitas palmadas. Capisce?

Resposta: Ir aos livros, aos amigos, aos blogs. Parar e respirar e, se necessário, contar até 10. No fim, confirmar com o nosso coração.










Cipreste

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Vamos falar disto.

Dentre os meus amigos e conhecidos, quem esteja mais ou menos atento, já terá percebido que tenho dado alguns passos para sair do armário.
Ou seja, tanto andei que arranjei coragem para dar a cara: OLÁ, O MEU NOME É CIPRESTE E SOU PORTADORA DE ENDOMETRIOSE.

Trata-se de uma doença que me tem tomado alguns dos dias… desde os meus 14 anos.
Fui diagnosticada pelo 4º médico a quem me queixei, aos 27 anos (13 anos depois  do início dos sintomas!). Fui operada. E fui ignorante porque não procurei mais informação na altura, pensei que estava curada. Mas não. Tudo voltou. Hoje, às portas de fazer 40 anos, continuo com muitos dias marcados por esta malvada.

Muito há a dizer sobre a vida com endometriose.

Não nos olhem com pena, mas façam-nos um favor: ajudem a passar a palavra.
Porque CHEGA de deixar esta doença passar impune.
CHEGA de ouvir alguns médicos ainda da idade das trevas dizer-nos que é normal ter dores.
Aos que quiserem, e puderem, venham caminhar comigo no dia 13 de Março.

Não sei dizer grandes coisas sobre isto. Deixa-me sem palavras.

Não esqueçam o meu pedido: passem palavra.

Vamos falar disto.
Obrigada.

 

Fico com o meu sonho.

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Cipreste

domingo, 8 de dezembro de 2013

7 poemas para o sol que me aquece o sangue

Hoje é o dia

i. (Ainda Outra definição de mar e de mim próprio consoante a maré[1])
asa em viés
sombra inclinada à espera
vela norte mar adentro
terra atrás: muito atrás
saber que não é nada
tudo. nada
para não te
afogares.

ii.
pleno momento é dia,
sol de tudo que navego

iii
és um instante
o peito um polvo
no teu olhar
luz acesa
lassidão que nos macera

iv.
excisão de dor
impossível
talvez um excerto do meu sorriso
no teu peito

v.
Instala-se na letra
o seio do corpo nu à sombra
cercado pelas grandes árvores
lenha para queimar
lentamente.

vi.
tempestade corpo
habitado

vii.
o espaço entre as coisas é
um buraco para ver através da noite

hoje é o dia
para continuar

será um dia em breve.




[1] Outra definição de mar e de mim próprio consoante a maré – título de poema de João César Monteiro.



Chaparro

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

(ritos de passagem)

Nada mais perfeito do que uma casa enfeitada de natal com uma caixinha de música a tocar durante a vida vazia de filhos. Digo: nada mais perfeito para espiar a ferida de uma não-mãe.
Estou a dias de completar 40 anos. Programei-me com mestria para estas construções culturais. Datas, marcos, lugares, cheiros. Aceito-os, não os renego, não sou, no entanto, dramática em relação aos mesmos. Assumi há já algum tempo que sou assim, evoco estas coisas, é uma característica como qualquer outra. As décadas: Gostei muito de fazer 30 anos, foi no final de um ano muito duro para mim, aquele em que recomecei a minha vida numa cidade onde não tinha amigos nem família, apenas trabalho. O ano seguinte a um divórcio, com uma mala cheia de lutos por fazer.
Ainda que com alguns golpes por sarar, senti os meus 30 como uma vitória. Foi um dia feliz passado com aqueles que amo, e que me amam.
Há dias decidi que quero fazer uma festa para celebrar os 40. E assim será. Mas não vou fingir que entro nesta época natalícia com o coração incólume. Não, não vou fingir.
Fechou-se uma porta. E eu tranquei-a.

Nunca hei-de gerar um filho dentro de mim. Nunca hei-de ver o meu corpo transformar-se. Nunca hei-de ser abordada pelos que me amam a abraçar-me a barriga, a fazer promessas para dentro dela. Nunca hei-de parir. Com dor ou sem ela. Nunca hei-de parir. Nunca hei-de ter um bebé em cima de mim, acabado de nascer e eu cheia de lágrimas de felicidade por receber esse sentimento misterioso. Nunca hei-de ter as entranhas atravessadas por águas de dar à luz. Nunca hei-de dar de mamar ao meu filho. Nunca hei-de ter o meu bebé nos braços, adormecido, aconchegado, consolado. Nunca hei-de ouvir o riso dobrado do meu bebé. Nunca.

Tenho de encontrar um lugar onde sepultar este sonho. Os médicos, sábios, propõem que coloque na mesma cova o meu útero e os meus ovários. E fico eu, para lamber esta ferida. Oiço música triste. Enquanto choro, deixo acesas as luzes da árvore de natal.
Eis que esta luta se metamorfoseia agora num luto.

 

(procurar o chão, quando o "you" em "fix you" somos nós próprios)


When you lose something you cannot replace
Tears stream down your face



Cipreste