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sábado, 19 de março de 2016

ser pai

Conheci o Chaparro no aeroporto. Foi bonito, um acaso bonito pelas mãos de um amigo comum.
Essa história fica para outro dia, o que quero contar é que menos de 5 minutos após termo-nos conhecido já o Chaparro me estava a mostrar as fotografias do Freixo, com a carteira na mão. Cerca de 5 fotos, desde bebé até à idade actual, 6 anos.
Eu estava com 31 anos e ele com 30. Era Março do ano de 2005 e ninguém das nossas idades andava com fotografias dos filhos nas carteiras. Pensava eu.
Esta é uma coisa que o Chaparro faz: abrir a carteira e mostrar fotografias dos três filhos enquanto os seues olhos brilham.
Quando paro para perceber a sorte que tenho na vida, quedo-me muito na sorte que tive em conhecer o Chaparro. Acho mesmo que foi um golpe de sorte encontrar num tão grande amor o melhor pai que poderia imaginar para os meus filhos.
Esta aventura da parentalidade é maravilhosa não apenas pelos filhos que tenho mas por quem é o pai com quem caminho lado a lado nela.


Chaparro,
Ontem, os teus filhos estavam verdadeiramente ansiosos por conseguir transmitir, nas prendas que te fizeram, o quanto gostam de ti. O mai'novo disse: espero que o papá goste porque estes são os meus sentimentos.
E é isso, estes são os nossos sentimentos. Feliz dia do pai.




Aos pais, aos órfãos, aos que nunca souberam o que é ter um pai mas sabem que é ser pai, aos que perderam os filhos, um beijinho especial neste dia,

Cipreste


p.s. não levem a canção à letra... beautiful boyz

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

gripes emocionais

O fim-de-semana chegou. O fim-de-semana voou. Nele coube tanta coisa que parece ter sido uma semana. Vimos paisagens maravilhosas, Portugal é um país tão bonito. Trabalho e lazer. Ou "trabalho que é lazer" e mais lazer. Comida gostosa (que também faz parte da felicidade). Pessoas do melhor que há, de calibre boa gente
É tão bom sentirmo-nos rodeados de gente boa. Podermo-nos despir de cuidados no que dizemos. Poder dar uma opinião sem recear ferir sensibilidades, ser interrompida ou interromper em liberdade, ser calada ou poder mandar alguém calar porque se está a dizer disparates. Discordar ou concordar, no conforto da cumplicidade. Sorrir. Rir. 
Nem sei se tinha dado conta, andava um bocadito cansada dos ambientes que se crêem subversivos e contra o  politicamente correcto mas que, vai-se a ver, e é, afinal, tudo politicamente frágil

Adiante, que eu quero é dizer que o meu fim-de-semana foi muito doce. Os meninos conviveram com amigos novos. Brincaram muito. Comemos quase sempre em restaurante e eu fico tão orgulhosa da forma como os meus filhos se comportam em público. Dormimos numa espécie de camarata, os quatro. Fomos convidados para um jantar de família de pessoas que não conhecíamos. E ali nos envolvemos. 

E fiquei doente. 

Pois. 
Sábado à noite, após o tal jantar em família, subitamente comecei a ter sensação de “anginas”. No espaço de uma hora deixei de conseguir falar e engolir saliva. Fomos para “casa”, tomei uma dose de brufen e aspegic e cama. Os meninos ficaram assustados, coitadinhos. Pus-me a (tentar) rir e tal para os tranquilizar, mas nada. O que eles queriam era aconchegar a mãe. Estive 12 horas na cama e acordei (quase) fina. Eu nunca fico doente, tenho estas ameaças, tomo doses cavalares e consigo sempre reverter o processo em cerca de 12/24 horas. Ontem, tinha sensação de cabeça oca (o Chaparro disse-me que sempre fui assim, só que às vezes não dou conta :) ). 
Hoje, estou ainda com o corpo dorido, mas a cabeça já me parece inteira. 

Nunca fico doente. A endometriose foi a minha maleita, mas já passou. Fico muito escandalizada de cada vez que se me dão estes chiliques. Porque gosto muito de me gabar de ter saúde de ferro. 

Tenho uma teoria sobre estes episódios de ameaça que acabam sempre por recuar e não se traduzem em gripes ou outros, de facto. Eu acho que, quando faço viagens emocionais muito intensas fico mais frágil e o meu corpo reage assim. Ao invés de me dar para as crises de pânico ou assim, fico com sensação de gripe. 
A semana passada foi intensa em reflexões. Culminou na sexta-feira, quando fiz aquela pequena viagem emocional assim para o intenso. Depois foi o serão de sexta-feira, copos com trabalho e muito riso. O dia maravilhoso de Sábado em que cumprimos uma agenda enorme e convivemos. A envolvência daquelas pessoas, tudo, tudo me trouxe muita comoção e acho que o corpo deu de si. 

Lembram-se desta crise que descrevi? E quando o meu pai faleceu fiquei sem voz vários dias (e não foi por ter gritado ou chorado intensamente), com queixas respiratórias que não se traduziram num diagnóstico de facto. Agora deu-me para a somatização? 
Acho que o número de vezes que isto aconteceu já me deixam confirmar a teoria, são crises agudas de gripe emocional. 

Bom, mas agora é segunda-feira e há uma semana inteirinha de muito trabalhinho pela frente. 
Vamos a isto, 
boa semana a todos, 
Cipreste

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Consolo

Ontem, foi o último dia de trabalho do Chaparro. Alegando a extinção de postos de trabalho, o patrão milionário viu-se obrigado a arrumar contas com os primeiro 25 que despachou colectivamente, alguns com 30 anos de casa. E assim se viram livres dos 2 meses legais da tortura da praxe que distam entre a oficialização do despedimento e a sua concretização.

Ontem, entre intervalos do meu trabalho, acompanhei o meu pai nas consultas – Oncologia Médica e Consulta da Dor. O dia começou ameno, mas quando chegou à Consulta da Dor começou a queixar-se de forma mais intensa. Contratempos e urgências a que os médicos foram chamados, levaram-nos a perceber que as dores do meu pai não eram ali uma urgência major. E nós compreendemos. Nós compreendemos sempre. São 13 anos a arrastar-nos entre muitas especialidades.
Agora, a especialidade da dor.

O meu pai saiu de lá aliviado da dor. Eu, nem por isso.

Trouxera o carro para a cidade, a 100km de casa deles, ainda insisti que os levava, que conduziria o seu carro. Mas ele é um resistente. Disse-me: eu consigo. E eu acreditei nele. Lá foram. A minha mãe ligou quando estavam a chegar. “Quando chegarem, liga-me”. Que é para eu ficar mais descansada. Mas eu não fiquei mais descansada. A minha mãe disse “Já chegámos, o pai está melhor.” e ele, lá do volante, disse bem alto, para eu ouvir, “beijinhoooos!”. E eu disse “beijinhoooos!”. E o meu coração fez aquela coisa de ficar muito pequenino e muito grande ao mesmo tempo.

Tive de anular umas das reuniões que ia ter mas ainda consegui ir à outra. O Chaparro foi buscar-me no fim, com o porta-bagagens cheio de caixas com livros e catálogos e mais não sei o quê – o espólio que lhe restou.

Dias grandes.

Hoje, vim ainda mais cedo que o habitual, sozinha, de carro, e ele lá ficou. Vai ao banco e vai continuar a obcecar com as várias hipóteses profissionais, que maioritariamente passam por criar o seu próprio emprego. Não vale a pena ter a veleidade de que conseguirá, na conjuntura actual, emprego na sua área.

Costumávamos sair de casa juntos pela manhã. Só temos um automóvel. Ele deixava-me de manhã e seguia, ao final da tarde eu regressava a casa de autocarro ou a pé. Não sei como vai ser agora.
Estacionei na garagem do meu trabalho, no -1, o elevador desceu ao -2 para apanhar mais alguém. Entraram 3 colegas com quem simpatizo. Um perguntou-me pelo meu pai e dei por mim a responder “um dia de cada vez” já entre lágrimas. Coitados, embaracei-os. Pediu-me desculpa por perguntar. Eu agradeci o seu cuidado ao perguntar. E desculpei-me pela vontade própria das minhas lágrimas.

Cheguei ao meu gabinete para de seguida sair com um cigarro e uma moeda para tirar café da máquina.
A caminho do cantinho dos fumadores, trauteava que a vida é sempre a perder.
Éramos 3 fumadores. Uma desabafou que é 6ªfeira, o outro disse em desalento que é igual a ser fim-de-semana. Ele não trabalha por turnos nem noites, os dias são iguais porque sim e rematou que somos sortudos por ter emprego. Eu não disse nada. Eu pensei “hoje é o primeiro dia do Chaparro desempregado”.
Pensei que sei que sou sortuda por ter emprego e pensei que sou ainda mais sortuda por ter um emprego em que não estou simplesmente a enriquecer um porco rico que tem coragem para despedir pessoas com cancro ou acabadas de comprar casa ou de ter um filho – esse é o ex-patrão do Chaparro. É essa a forma como cumpre a responsabilidade social de que tanto os da sua laia apregoam fazer.
Eu estou no serviço público e sei que é isso que faço. Nenhum ordenado paga a humanidade que venho buscar aqui. Estou feliz por ver o Chaparro livre daquele ambiente.

A vida pode ser sempre a perder, mas há formas mais dignas de perder do que outras. Não odeio o que é fácil, nem acho que tudo o que vale a pena é difícil de conseguir. Mas tem sido a nossa experiência de vida. Estou mesmo muito feliz por ver o Chaparro livre daquele ambiente. Consola-me saber que pode estar aí ao virar da esquina o realizar de um sonho para ele.
Ok, ainda não será o sonho de ter uma cabana na praia, mas já não será nada mau. Está nas nossas mãos.

Deixo-vos com este poema:

BIOGRAFIA

Tive amigos que morriam, amigos que partiam
Outros quebravam o seu rosto contra o tempo.
Odiei o que era fácil
Procurei-me na luz, no mar, no vento.

Sophia de Melo Breyner Andresen



Um bom dia para vós,
Cipreste

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Companheiro de vida

Não me lembro exactamente quando soube que o Chaparro era o companheiro com quem queria partilhar a minha vida. Guardo muito carinhosamente a memória de um email que me enviou num dia em que eu estava triste e lhe pedi para me fazer rir. Nesse dia, pensei na amizade que me dera nos últimos tempos, no seu sorriso, na sua generosidade que é enorme. Senti um calorzinho bom. Ainda éramos apenas amigos. Ficou este poema, constante desse email, como parte da nossa antologia:


- Gostas da palavra litote?

gostas da palavra litote?
é um tropo.
e não gostas da palavra tropolitote?
então diz comigo:
tropolitóóóóóóóte !
litote
tropope
tropolipope
tripopopote
tripolitripolitote
tripolitripolipoli
toliloli
tropopopoli
tripopeli
popoli
poplili
popli
popliiii,

Ana Hatherly in um calculador de improbabilidades
Quimera, 2001
Cipreste

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

mudar de vida

O meu pai, doente oncológico há 13 anos, portador de doenças diferentes entre si e muito graves, tem-nos ensinado as maiores (as mais básicas) lições de vida. Há uns 3 anos, disse-me «Olha que a vida são mesmo só 2 dias, eu pensava que eram 3, mas são só 2.». A minha mãe confirmou e disse-me das vezes em que se chateou e se preocupou em vão com coisas, afinal, insignificantes e de como se arrependia das energias que gastou nesses eventos.

Acho bonito cumprimentar os outros com um “saudinha!”. 
~

Haja saúde.

Eu sei: há dias muito maus nesta passagem. Um dia, por exemplo, quis morrer, tive uma dor tão negra dentro do meu peito que me achei indigna de viver. Sobrevivi à custa de poupar um desgosto aos meus pais.
Hoje, o dia começou como os outros. Ontem à noite, quis rever o American Beauty e assim fiz. Fui para a cama inspirada pelo filme, como das outras 4 ou 5 vezes em que o vi.
~
Há momentos que nos parecem ser guiados por aquilo a que, eu – ateia, agnóstica ou lá como me queiram apelidar, chamo de anjo da guarda.
Hoje, o dia começou como os outros, com o lusco-fusco veio uma mudança profunda nas nossas vidas.
Sentámo-nos, trocámos olhares, conversámos e soubemos que isto, afinal, há-de ser uma insignificância.
O meu pai continua a levar os dias de bem com a vida, todos os outros vão bem de saúde, nós também. E nenhum de nós quer morrer.
Vamos ficar bem.
Nós estamos bem e é assim que seguiremos pela estrada renovada que ajudaremos a abrir. Haja saúde. E se a não houver, cá estaremos - uns para os outros.

Saúdinha!
Cipreste

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Regresso

Depois do corpo ferido, o corpo renovado. Com a alma esclarecida.

Sermos sujeitos a uma cirurgia que nos amputa pode, e deve, servir para uma renovação do nosso eu. Sou a mesma Cipreste, aquela que quer sempre ser melhor e tirar o melhor partido desta passagem pela vida. Sou uma Cipreste no caminho da conciliação.

Sofri dores desde que fui menstruada. Conheci os sentimentos da infertilidade, da impossibilidade de realizar um sonho. Conheci, por momentos, a felicidade da gravidez para, de seguida, saber o que é a perda da esperança. Outras perdas se apresentaram. Tudo isto pode ser vivido de forma dramática, mas chega o dia em que nos cabe a decisão: Carpe Diem.

Tive de me recolher junto dos que se juntaram a mim.
Nestas horas, o crivo acciona e mostra-nos o que é real - a amizade revela-se nas horas difíceis.

Nunca tinha sentido a real vulnerabilidade física, nem tinha percebido que seria necessário ter alguém a meu lado a cuidar de mim. Fiquei em espanto quando percebi que dependia do bem-querer dos que me querem bem. Tive quem cuidasse de mim. Tive o cuidado e o carinho incondicionais da minha sogra, da minha mãe e do meu pai. Ajudaram-me a tomar banho e a vestir, a sentar, deitar e levantar. Descascaram-me maçãs, trouxeram-me flores. Limparam-me lágrimas e perguntaram-me amiúde “tens dores?”. Mas eu não tinha. Eu não tive dores. E chorei menos de meia-dúzia de vezes. Na verdade, passei este tempo sempre bem disposta, nem sequer estive irritável ;) vá lá que tenha tido um ou dois momentos, mas, de resto, a disposição tem sido das melhores e a superar (para melhor) o que pensei que estes dias viessem a ser.

E há a novidade da vida devagar, não me lembro de ter vivido alguma vez dias assim, de forma lenta e calma. Quero mesmo tirar proveito desta aprendizagem.

~ ~ ~

E o meu amor...

O meu amor pôs-me creme nas cicatrizes e disse, pesaroso, “cortaram a minha menina”. Depois, conformou-se e explicou “mas tinha de ser, para não teres mais dores”.

~ ~ ~

A cirurgia foi mais extensa do que planeado. Era para ter sido por laparoscopia (os “furinhos”) e começou como tal – 3 furinhos, mas o meu útero era enorme e tiveram de reverter para laparotomia (incisão no abdómen). Tiraram tudo e “limparam” muitas aderências. Isto fez com que tudo demorasse mais tempo e exigisse outros cuidados. 29 agrafos, contou-me a médica quando acabou de os tirar.

Estive 3 semanas em modo zombie, não li, não me liguei à net, nem sequer liguei o computador. Raramente atendia chamadas.
Senti a fragilidade do corpo e do cérebro.
Fui retomando algumas actividades lentamente. Respondi a mensagens, comecei a atender os telefonemas todos e a ir à net.
Para a semana, regresso ao trabalho. Confesso que já tenho saudades, mas senti e percebi a importância de não me acelerar nesse retorno.

~ ~ ~

Entretanto, li mais um livro sobre adopção e estou a meio de outro. Tivemos a visita domiciliária e aguardamos o certificado.
Estamos em modo de espera.
E regresso aqui.

Hoje de manhã, em chat com uma amiga de infância, esta voltou a certificar-me “I know that you will be a good mom”. Respondi-lhe com a mensagem deste meme que vos deixo. Ela, que é mãe fantástica de duas crianças fantásticas, confirmou e rimos.

Olá :)

Cipreste

quarta-feira, 7 de maio de 2014

mãe ~ avó

da ausência dos últimos dias...

Começamos o dia da mãe com a notícia do falecimento da avó P., avó paterna do Chaparro, bisavó do Freixo. Um dia triste. Dias tristes.
A avó P. está muito presente nas memórias do Chaparro - como uma protectora, uma salvadora em momentos mais difíceis da sua infância.

Não sabemos se o Universo fala connosco.
Factos: a avó P., junto com a minha avó M. eram as nossas avós paternas, eram as nossas avós maternais. Uma foi a enterrar no dia da mãe, a outra foi embora no dia da mãe.
Dói-me que os meus futuros filhos não as tenham conhecido.

Era-me muito fácil gostar da avó P. e eu sabia que o sentimento era recíproco. A sua solidariedade para com a minha infertilidade era uma coisa forte, de mulher para mulher. Era muito bom estar de mãos dadas com ela durante as nossas curtas visitas. Estava sempre a mandar-nos embora, não gostava da ideia da viagem longa que tínhamos de volta. Era demasiado prática, a vida assim lho exigiu.

Teve direito a uma igreja cheia de familiares e amigos, todos doridos, todos com um sorriso no rosto por terem feito parte da sua vida. Cumprimos os rituais funerários e mimetizámos o seu discurso se nos pudesse correr a todos dali por estarmos a "perder" dias de trabalho e, afinal, não valer a pena tanta coisa só por causa dela. E sorrimos.

Voltou para os braços do seu amor que perdeu há 50 anos e cuja memória evocava sempre, descansam agora juntos.

À noite, brindámos a si e agradecemos-lhe pela lição de vida.

Adeus, avó P.

Cipreste



quinta-feira, 1 de maio de 2014

manhãs na esperança

Dou conta que o acordar dos fins-de-semana e feriados está diferente nesta casa. Vamos dando lugar ao sonho e, por vezes, após darmos os bons dias um ao outro, há um que diz “vamos ver se os meninos já acordaram?”. E ficamos ali uns segundos com um sorriso feliz nos rostos. E prosseguimos com os dias ainda sem filhos. Digo "ainda" porque é essa a grande diferença entre o sonho de se desejar um filho biológico e o sonho de se desejar um filho adoptado – é certo que o filho adoptado vai chegar. Hoje acordei com o coração cheio de esperança, ouvi o silêncio desta casa e sonhei acordada e o coração conseguiu insuflar mais um pouco. Fiz o pequeno-almoço para ambos, o Chaparro já havia descido ao escritório pois anda em época de exames. Deu-lhe para estudar e está no 2º ano de um curso que lhe parece estar a encher as medidas, ou, pelo menos, tanto quanto pode um curso à distância preencher um trabalhador-estudante a quem as 8 horas são uma utopia mas que ainda assim consegue arrancar 18s e 19s e até 20s nos exames. O meu orgulho e um belo exemplo para o Freixo e para os filhos que haverão de chegar. Portanto, preparei-lhe um tabuleiro com um pequeno-almoço cheio de mimo. Fui consultar o e-mail à espera que já tivesse chegado uma mensagem que aguardo já há alguns dias: népia. Aproveitei e vi este vídeo que me enviou uma companheira de viagem na adopção, uma companheira que se me apresentou esta semana, através de uma "janela privada" [olá! :)]. Sabe tão bem falar com quem está no mesmo caminho. Encontro poucos lugares, pelo menos de comunidades portuguesas. Ou, então, sou eu que não sei procurar as comunidades online. Por vezes, sinto uma certa solidão “em português” nesta imensa rede internética ao explorar o assunto da adopção. Adiante, é apenas um desabafo. Dizia que vi o vídeo e cá estou, com o coração ainda mais um bocadinho insuflado. Destaco duas passagens que me tocaram especialmente, por volta do minuto 13 e depois a partir do minuto 27. Tenham um bom dia do trabalhador. Mais logo, hei-de marchar um pouco em comemoração do 1º de Maio e voltar para casa com um cravo na mão. Agora vou jardinar um pouco, se é que se possa chamar de jardinar a tratar de um canteiro de 5x1,5m :) bom dia.

Cipreste


terça-feira, 29 de abril de 2014

Planos para amar - Parte II

Ainda não tinha afixado aqui a parte II da saga Planos para amar simplesmente porque não tinha fotografado as provas.
Alguns de nós somos mais tagarelas do que outros, entre mim e o Chaparro, a tagarelice está na mesma proporção de posts afixados no blog: 99% meus para 1% dele. Por vezes, comenta os posts que vou colocando aqui, ora na caixa de comentários, ora por e-mail, ora frente-a-frente. Desta vez, deixou este "comentário", que encontrei no dia seguinte a ter publicado o post, nas paredes da nossa casa:


Esta é uma parede de cerca de 50 cm que tem do lado direito a porta do nosso quarto e do lado esquerdo a porta do quarto do(s) nosso(s) futuro(s) filho(s), dá para espreitar o sofá-cama que ocupa o espaço enquanto não houver lá uma cama com destinatário(s) específico(s).

Todos os dias: o amor :)

Quem tem um Chaparro tem tudo.

Cipreste

quarta-feira, 19 de março de 2014

afinal

tive de vir cá, para deixar a questão no ar: será que de hoje a um ano se dá um cenário destes cá por casa?

Feliz dia do pai! :)

Cipreste

sexta-feira, 14 de março de 2014

Uma espécie de carta aberta ao Chaparro

Que dias.
Dias cheios de tudo. Sinto que deixei de ter noção do tempo.

Ontem, no regresso de Lisboa, o Chaparro dizia-me que se sentia realizado, que tinha sensação de missão cumprida. Naquele momento, tudo se revolveu dentro de mim e fiquei sem voz por uns segundos. Queria dizer-lhe o mundo todo e não conseguia. Sentia as ideias na minha cabeça, mas não conseguia fazer delas um discurso. Após alguns segundos de silêncio consegui confessar-lhe pensamentos muito maus que tive há duas semanas. Já na altura eu sabia que eram pensamentos maus e que, ao confessá-los, iria levar com uma rodada de “sua parva!”. Por momentos, senti um poucochinho daquilo que penso devem sentir pessoas que ficam fisicamente dependentes de terceiros e resolvem acabar as suas relações amorosas para não “prenderem” a vida dos seus companheiros.

Por vezes, a carga de se viver com determinadas condições é tão desmedida que se perde o Norte e damos por nós a ter pensamentos que jamais pensámos vir a ter. Subitamente essa noção de se ser um peso na vida de alguém está dentro da nossa pele e, inibidos de qualquer clarividência, o que nos surge é a vontade de libertar o nosso objecto de amor de tal encargo.

E podem chamar-me parva à vontade, mas foi o que eu senti. Que viver a meu lado acarreta demasiada empreitada, que a vida poderia ser muito mais simples longe de mim. Que provoco instabilidade a qualquer um que se proponha viver os dias a meu lado. Que nunca se sabe com o que se pode contar, porque num dia estou activa e faço imensas coisas e até mobilizo gente para coisas giras mas no dia seguinte posso estar prostrada no sofá. Acreditem que cheguei a questionar-me se não seria bipolar. Eu sei que é uma leviandade imaginar psicopatologias, mas juro que o pensei.

As voltas que temos dado para construir uma família - consultas e tratamentos de fertilidade, as voltas e pesquisas e estudos para uma adopção consciente, são tudo manobras que tiram muito dos dias a outros tantos projectos em que estamos metidos, e que seriam suficientes por si só para preencher a vida. São coisas maravilhosas que nos realizam e chegam a muita gente, e não tem nada a ver com filhos nem família nem saúde. Mas deu-nos para desejar filhos, e ao Chaparro calhou uma mulher que não é super-fixe-e-bué-fértil e que ainda-por-cima anda sempre a queixar-se de dores-aqui-e-acolá.

E foi assim que, de baixa médica em casa, dei por mim a pensar que o Chaparro estaria a desperdiçar a sua vida e criatividade ao meu lado e que provavelmente estaria muito melhor sem mim. Porém não tive coragem de lho confessar na altura, porque ele nunca se zangou comigo nestes quase 8 anos em que estamos juntos, mas não imagino que fosse ser muito agradável vê-lo zangado. E uma pessoa minimamente consciente quando tem pensamentos destes sabe que são proibidos e sabe dos argumentos que possam ser arremessados contra os mesmos. Pelo que me sobrou uma tarde de auto-comiseração em modo Madalena arrependida, no sofá, com (muitos) lenços de papel.

Portanto, ontem fiquei sem voz quando o Chaparro me disse sentir-se muito conciliado com a sua vida. Quer dizer… ele passou as últimas semanas a alimentar-me e a cuidar da casa e a assumir o meu papel nos nossos outros compromissos, faltou ao trabalho e foi para Lisboa acompanhar-me na marcha com o telefone a tocar cons-tan-te-men-te, rodear-se de mulheres como eu (não lhe bastasse uma!) e… e, nada! Sim! Faz todo o sentido, Chaparro! Sim, a nossa vida é completa mesmo com todos estes problemas e preocupações.

Podia ser sem dor, pois muito bem, mas é a nossa vida. E é uma vida partilhada. Linda.

Nunca (nunca) me mostraste a mínima dúvida ou impaciência sobre os meus relatos de dor. Saberás o quão gratificante é ter alguém que acredita em nós e que não nos apelida de histéricas inconformadas na sua condição de mulher? Oh céus. És uma dádiva tão maravilhosa. Dentre tantas coisas magníficas que és, és a negação da solidão.

E deves sentir orgulho em quem és.

Viste bem a quantidade de homens que (não) conseguiram estar lá ontem? Não é fácil (nem barato) faltar ao trabalho assim a meio da semana. Mas tu lá conseguiste estar ao meu lado. E entregaste panfletos pelas ruas de Lisboa a dezenas de pessoas. Chegaste-te às pessoas para as sensibilizar para uma doença comum mas incapacitante e negligenciada. De certeza que fizeste a diferença na vida de muitas pessoas ao apresentar-lhes a palavra endometriose.

Fazes a diferença bonita, todos os dias, na minha vida.
Perdoa-me o tom dramático, mas tenho de te dizer que se morresse hoje iria feliz e realizada.

Bem-dito sejas, tu, Chaparro, meu amor tão grande.

do filme Up (2009)

Cipreste

quarta-feira, 5 de março de 2014

Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma*

Desci as escadas para almoçar e assim que sentei à mesa as lágrimas caíram copiosamente. O meu nível de frustração naquele momento estava muito elevado. Tinha acabado de passar por um momento de dor física horrorosa e esperava poder sentar-me sossegada com o Chaparro e o Freixo - que veio passar as mini-férias de Carnaval à sua segunda casa. Só queria um almoço em família, com o Chaparro a dizer disparates e eu e o Freixo a unir forças em desaprovação jocosa do seu comportamento, para que todos sentíssemos aquele calorzinho que se sente por dentro quando sabemos que estamos todos ali, que o mundo todo está naquela sala de jantar. E que nos pertencemos e que podemos contar uns com os outros daqui até ao céu. Mas caí em lágrimas. Um farrapo. E fiz do nosso almoço uma coisa preocupada e desalentada.
Já deitada no sofá, não me contive e pedi desculpas ao Freixo pelo almoço logrado e este, um querido, como sempre, disse-me que eu não tinha nada que pedir desculpas.

Não queria que este Carnaval tivesse sido em torno das minhas dores, mas não havia nada a fazer, elas ali estavam e o Chaparro deixou bem claro que íamos passar aqueles dias assim: em família.
Não vale a pena entrar em pormenores sobre o que aconteceu: uma desregulação que teve de ser regulada por “tentativa-erro” com medicação. Toda a violência física deste vaivém de hemorragias e dores levou-me a um estado de labilidade emocional que me assustou. E nessas alturas não há nada como nos deixarmos à mercê da protecção da família e dos amigos íntimos porque o resto da humanidade apresenta-se-nos muito hostil nessas horas.

Hoje voltei ao trabalho e pude fazê-lo devagarinho, o que me soube bem. Fiz daquelas coisas que nos deixam o sentimento de missão cumprida para o dia. Foi gratificante. É assim em muitos dias da minha lida e ainda bem que o foi hoje. Acrescente-se-lhe o calor e o cuidado com que me receberam de volta (só estive 6 dias ausente!). Foi tudo muito conciliador.
Porém, nem por isso senti menos vontade de vir para casa descansar. Embora as considere insignificantes, as dores ainda andam por aqui e tanta imensidão de existência humana com que lidei hoje deixou-me muito cansada.

E eis que chego ao tema cansaço.
Eu sei. Eu sei o que se passa. Não vou tentar fingir. Nem fugir.
Não foram apenas as perdas de sangue e uma eventual anemia (que não chegámos a avaliar) nem só o cansaço disso tudo que me trouxe a este estado de fragilidade.

Sou demasiado consciente dos meus processos para virar a cara para o lado, no entanto, às vezes demoro um bocadinho a formar uma linha de pensamento sobre o que se está a passar comigo. Agora reconheço o que se passa e tenho de me organizar para aceitar as feridas que estão em mim. E quando falamos de feridas, falamos de friabilidade e neste momento tenho de ter cuidado ao lamber as minhas pois não as quero em carne mas antes a sua cicatrização. E eu sou daquelas pessoas que aceita que as cicatrizes devem ser acarinhadas e servir para que nos lembremos - sempre. Não acredito que haja uma solução para se ir da ferida à pele intacta. [receio ter-vos proporcionado mais um momento de metáfora barata(?)]

Posto isto, tive de dar a mão à palmatória e adiar uma série de compromissos. Consegui reformular todos, felizmente. Custou-me especialmente um compromisso profissional que implica com a vida de uma pessoa especial, mas também sei que quando o retomar será comigo mais completa para assumir as competências que me são devidas.

E depois há outra coisa, só para tentar complicar decisões sensatas: sabem aquelas pessoas que não sabem parar? Pois, eu sou daquelas que ficam a remoer e a pensar que é um exagero, que afinal conseguiria dar vazão aos compromissos todos e tal. Mas felizmente tive um momento de lucidez quando assumi que não. E hoje senti que o esforço de ir trabalhar com tudo de mais mundano que implica - desde o acordar bem cedo, arranjar-me, ter energia para empatizar com pessoas cheias (cheias) de problemas, é o esforço que posso fazer.  Adiante.

Ao lusco-fusco, só quero cair nos braços do meu querido Chaparro e fazer tudo o resto o mais devagar possível. Sem grandes planos, segurando as pontas àquilo que não vale a pena abandonar, procurar olhar para as coisas vendo-lhes a beleza possível sem fazer um drama de cada vez que me der para o choro. 

É um grande rol que enfrento neste momento. O luto pelo sonho de gerar um filho. O luto do que implica uma histerectomia radical, aos 40, como descerrar de uma história de infertilidade. A luta do meu pai. A luta pela minha saúde, pois a cirurgia que aí vem ainda me pode trazer dissabores assim como não me garante a cura da endometriose, e a vida com a medicação e efeitos secundários de uma histerectomia radical.

Para já, o que se passa comigo é isso - a vida, e a minha é tão cheia de coisas boas que me parece que as más acabam por ser na mesma proporção advindo daí esta intensidade de mágoa.

Para já, batalharei com uma das minhas armas mais fortes: o amor pelo qual estou rodeada. Donde tenho de salientar a incondicionalidade e o orgulho com que o Chaparro se apresenta lado-a-lado comigo.
Sou uma felizarda.

Cipreste


Fulfillment, Gustav Klimt



* Miguel Esteves Cardoso via Citador

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A vida é chorar e rir a vida inteira*

Tenho muito para vos dizer, muitos assuntos sobre os quais quero falar. Uns mais imediatos, outros mais generalistas. Mas os dias têm andado tão a vida é chorar e rir a vida inteira que me sinto francamente avassalada. Eu chego lá, eu sei que chego a um patamar mais funcional de novo, agora é preciso chorar e rir, tudo ao mesmo tempo e afincadamente, para depois continuar a chorar e a rir o resto da vida, da vida inteira.
Imagino que vos pareça incompreensível este recado, mas é o melhor que consigo neste momento.
Hoje é dia dos namorados - St. Valentine's Day, e não vou ser uma hater, vou ser canadiana de tipo "dia Hallmark" e dedicar isto ao meu amor, o meu querido (querido!) Chaparro. Não poderia imaginar amor maior na minha vida. Não poderia imaginar sentimento maior de paixão  e conforto, tudo ao mesmo tempo, de verdade, de uma verdade incondicional. Obrigada, meu amor.

Will you be my Valentine, Chaparro? 

Da tua,
Cipreste

Isto, com as devidas adaptações ;-)