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segunda-feira, 7 de março de 2016

a nova era

O que mais marca isto de se viver numa nova era é a ambivalência de cada momento. Niemeyer esteve muito bem quando disse que a vida é rir e chorar a vida inteira. Já sabíamos?  Pois já, mas ele é que o disse dessa forma bela e simples (haverá forma de se dizer belo sem ser simples?).
Repito isto tantas vezes, com este ritmo de respiração, por vezes arrogando-me na linguagem da Maria Gabriela Llansol:

a vida___________ é
rir
e chorar
a vida inteira______________________

Tenho andado muito atarefada com o luto do meu pai porque me tem doído muito. Tanto. Mas tanto que às vezes parece que, mais do que as pálpebras de chorar (que não choro), são as mãos que me doem.

Há dias, disse à minha psicóloga que me sinto nesta nova era como quem acabou de fazer uma mudança de casa.

Vejo-me sentada no chão de uma sala com os livros todos desempacotados (já estão desempacotados, ao menos isso). Estou sentada no meio dos livros, em pilhas maiores ou menores, no chão. Estou naquele momento em que olho à volta e ainda não percebi como os vou dispôr, como os vou dividir. Aliás, há alguns livros que já nem me lembrava de ter, ou talvez que até nunca tenha aberto. Está aqui tudo, só não foi tudo usado e agora tem de ser minimamente organizado.

Consegui perceber já uma coisa que me faz compreender muito bem o estado de constante inconformidade da minha mãe. A partir de agora, grande parte (senão todos?) dos momentos de felicidade serão acompanhados de tristeza.
Senti-o há bocado. Arrumei esta ideia à hora de almoço ao ver o Chaparrito tão feliz a dar uma volta naqueles comboios de moedinha, feliz por ter ido excepcionalmente almoçar com os pais ao centro comercial, ainda por cima num dia de aulas. Senti alegria pela alegria do meu filho, senti tristeza imensa por não ter cá o meu pai para vivermos esta alegria todos juntos.


Como é possível que se tenha perdido esta pessoa? A minha mãe tem razão quando resiste. Eu compreendo-a. E não vivi 50 anos com ele.


Hoje, os meus pensamentos estão mais com a minha mãe do que com ele. Deve ser isto aquela coisa do cuidar dos vivos.
Vou ligar à minha mãe. De novo, já nos falámos hoje.













Boa tarde a todos, desejos de boa semana,
Cipreste

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

"um dia sem rir é um dia desperdiçado"

O pai à paisana fala aqui de cinema de animação e lembrei-me de vos contar que andamos a ver Charlie Chaplin.

A ideia foi do Chaparro (aliás, a colecção de DVDs veio com ele) e foi mesmo uma ideia muito boa. Charlie Chaplin tem TUDO. Tem vida, tem dor, tem amizade, tem amor, tem as dificuldades mundanas que vão desde os relacionamentos sociais à falta de dinheiro e à fome, tem música e tem riso. 
Tem fotografia, tem palavras. 
É absolutamente emocionante ver um filme do Charlot com os meus filhos, a alegria deles, a atenção, os “oh” quando uma cena mostra alguma injustiça. Ser testemunha da descoberta deles do Chaplin é daquelas coisas bem bonitas.

Chaplin é completo, é vida, é como dizia Niemeyer - a vida é rir e chorar a vida inteira.


Fica a sugestão.

Cipreste



sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

coragem major ~ coragem minor

Por vezes, sinto-me tão perdida. Tão longe das soluções que passam pela expressão “basta fazer isto ou aquilo” e, pronto, “já está!”. Para além de me sentir perdida, também me chego a sentir mal por  achar que não estou a encontrar no amor a solução para os problemas dos meus filhos. A ideia de que o amor tudo cura é muito linda, mas não encaixa milagrosamente no quotidiano das nossas dores. Quando vemos os nossos dias a seguir rumos dolorosos e amamos, mas não conseguimos que esse amor cure, acabamos a colocar em causa a nossa capacidade de amor. Será que isto é amor? É que, repare-se, se o amor tudo cura e eu não estou a curar ninguém, então isto não deve ser amor.

É. É do camandro.

Uma pessoa lê estas afirmações: “A ideia da não vinculação é monstruosa para a espécie humana” e que “para desenvolver-se bem, toda a criança precisa que alguém esteja louca por ela”(aqui). E fica a questionar o seu amor. Será que amo mal? Será que não lhes mostro que sou louca por eles? Num instante, estamos a pensar, oh, não, estou a fazer mal aos meus filhos. Eles portam-se assim porque se sentem mal-amados e eu sou a pior mãe do mundo.

É. Tenho dias assim. Depois eles sorriem e abraçam-se a mim e acontece uma palhaçada qualquer e sobrevivo novamente a mim.

~ ~ ~

Ultimamente, comecei a reler alguns dos meus posts pré-filhos e tenho tido felizes encontros. Nem sequer posso dizer que tenho engolido muitas das minhas palavras ;) afinal, a maternidade não me veio mostrar assim tanta incoerência. Na verdade, e já que estamos a falar das diferenças antes-depois, posso declarar que a grande diferença é a forma como encaro as opiniões alheias. Antigamente, avançava com a minha opinião, mas restava uma dúvida pesada sobre a opinião alheia, agora, embora reste sempre uma dúvida – que considero a dúvida razoável, senão seria uma tola cheia de certezas, avanço de forma firme.
Uma pessoa que não se munisse deste mecanismo nunca poderia sobreviver no dias em que pensa que ama mal e recebe simultaneamente opiniões alheias destrutivas.

Adiante. Ao reler os posts, tenho encontrado um ou outro excerto muito certeiros. Sobre os últimos tempos por cá, este que já partilhei ontem:

“Compreender quem somos é um processo difícil – mesmo quando temos histórias familiares intactas, longa e discriminadamente detalhadas. Quando não temos nada disso, compreender quem somos é muito mais difícil. Não admira que não se queira falar do assunto o tempo todo. É uma tarefa árdua. É um trabalho doloroso. Mas não devemos concluir que o assunto não interessa só porque ela não fala dele. Ela está a tentar perceber quem é, mesmo que não fale disso todos os dias. ”(aqui)

Adoptar crianças “mais velhas” tem a benesse de encontrarmos pessoas que já conseguem elaborar sobre as suas emoções. Se o fazem são outros quinhentos, pelo menos já têm a bagagem neuropsicológica para tal.
Assim são os meus filhos: com competências para elaborar sobre as suas emoções. E o mais lindo é que gostam de o fazer.

Há dias, a nossa assistente social, em resposta ao nosso email periódico em que enviamos notícias com fotografias, respondeu “os vossos filhos estão lindos e cheios de competências”.

Ena! Pensei… os meus filhos… cheios de competências. Uau, isto soou-me bem, muito bem, tão bem. Uma mãe precisa de ouvir estas coisas.

E é mesmo verdade que estão cheios de competências.

Como todas as mães, antes de o ser, sonhei muito com o que gostaria de fazer com os meus filhos. Sonhei com a música que aprenderiam, que ouviríamos, os concertos a que iríamos. Sonhei com a partilha que faríamos com eles dos nossos passatempos. Os nossos passatempos, meus e do Chaparro, passam maioritariamente pela área das artes. Apreciamos muito o conciliar das artes à natureza, praia, bosque, etc. Assim, damos uns toques na fotografia, escrita, instalação, leituras públicas, e participamos na organização de eventos relacionados.
Várias vezes por semana, os meninos fazem actuações para nós que passam pelo teatro e pela música. Agora começaram a compor! É mesmo admirável porque nenhum de nós lhes deu alguma vez tal ideia. Levamo-los a ateliers de ilustração, teatro, música, etc. Vamos a concertos, às vezes, várias vezes por semana, pois na escola da Magnólia são muito activos e são quase sempre de entrada livre. E eles adoram. Vibram. Desde a música clássica ao jazz. E sabem estar numa sala de espectáculos. Vêm para casa e mimetizam tudo. O Chaparrito é especialmente delicioso a imitar músicos e maestro.

Posso dizer que os nossos filhos abraçaram incondicionalmente o nosso amor pelas artes e tiram verdadeiro prazer delas.

Depois, há dias inteiros em que a televisão não é ligada. Obviamente que é por princípio nosso, como o hábito é que faz o monge, quando éramos só nós dois já havia este registo cá me casa. Liga-se quando é para se ver algum programa em específico. Se já fizeram os tpc, se já se estudou instrumento, se a mesa está posta para o jantar, ok, vemos um pouco do zigzag (depois há também o pormenor de que não temos tv-cabo). Com sorte, apanhamos o ioga que eles adoram fazer.

Ainda mantemos os nossos filhos ignorantes quanto às outras tecnologias – smartphone, tablet, computador. Vêem nos nossos, connosco, e não jogam. Não tenho qualquer dor de consciência em relação a isto e sei que rapidamente apanharão o comboio quando começarem. Além disso andam aí umas manchetes nos jornais a falar dos perigos da utilização destes dispositivos antes dos 12 anos – right on! Estamos dentro do prazo.

Não tenho pressa para estar a falar com os meus filhos e ter como reacção o silêncio acompanhado de uma expressão de dormência deles perante um écran. Aliás, eles sabem que se não nos respondem a chamamentos enquanto vêem televisão que esta é desligada imediatamente.
Somos muito maus, muito intransigentes. Já sabemos.

Portanto, juntando este não desperdiçar tempo frente a écrans à tal resposta positiva que eles têm aos estímulos artísticos, é um corrupio de espectáculos em nossa casa.

Há duas semanas, fomos a Serralves porque tinha de ver a exposição da Helena Almeida (acabava nesse fim-de-semana). A Magnólia foi simplesmente maravilhosa. Interpretou as séries dela de forma deslumbrante. Usou espontaneamente as palavras “luto”, “ferida”, “belo”. As pessoas que passavam por mim deviam ficar ofuscadas com o brilho que saía dos meus olhos.
Fizemos fotografias interpretativas das obras frente a elas, assumindo posições muito engraçadas. Frente ao “abraço” fizemos uma fotografia com os quatro abraçados. Acho que a determinada altura andava uma pessoa a perseguir-nos e ficou felicíssima por poder tirar-nos essa foto.

A semana passada, a Magnólia "enviou-nos" um convite para uma exposição que montou no corredor. Deviam ver. Ok, depois fotografo para verem, como ainda está patente, posso voltar lá. Chama-se "sentimentos" e está dividida em várias ilustrações com placas identificativas - incluindo nome da autora e ano de nascimento (tão sweet :) ). O nome das obras passa pela designação "etapa" que se segue pela ordem com números romanos e depois a explicação de tipo "se pensas que não sabes dançar, põe música e começa a mexer-te, vais ver que sabes dançar". Ficámos de queixo caído.

Isto tudo para dizer que tenho andado a rondar uma certas e determinadas questões junto da Magnólia e comecei a usar estas competências. Afinal, a arte serve para quê?

Não se esqueçam de que estou a falar disto: “Compreender quem somos é um processo difícil – mesmo quando temos histórias familiares intactas, longa e discriminadamente detalhadas. Quando não temos nada disso, compreender quem somos é muito mais difícil. Não admira que não se queira falar do assunto o tempo todo. É uma tarefa árdua. É um trabalho doloroso. Mas não devemos concluir que o assunto não interessa só porque ela não fala dele. Ela está a tentar perceber quem é, mesmo que não fale disso todos os dias. ”(aqui)

Esta semana, aconteceu algo extraordinário: a Magnólia contou-me pormenores da sua vida anterior que não constam dos relatórios oficiais. Estou a falar de factos que vão além de relatos do quotidiano.
Digo-vos que isto não é nada fácil.

A Magnólia gosta muito de usar a expressão “pozinhos mágicos”.
Eu disse-lhe que, se eu pudesse ter os pozinhos mágicos, utilizá-los-ia para que ela nunca tivesse tido de viver estas coisas. Ordenaria que ela tivesse sido sempre feliz desde o seu primeiro minuto, que nunca tivesse tido que ser “retirada” e que ainda hoje fosse muito feliz com as pessoas do seu passado, mesmo que o preço fosse viver a minha vida sem ela. Fiz questão que compreendesse que não estava a dizer que abdicaria dela. Ela compreendeu, acenou a cabeça à medida que as lágrimas lhe corriam pela face. As minhas já corriam há uns segundos.

Fizemos um acordo, propus-lhe um novo exercício. Uma nova tentativa para ver se conseguimos transformar um comportamento que ela tem e que a prejudica. Aceitou. Estamos agora neste novo tempo. Estou cautelosa. Já falhámos tantas vezes. Mas sinto cada vez mais a solidez disto tudo.



A adopção é uma coisa violentíssima. Para todas as partes. E não há texto ou palavra amiga que nos consiga fazer vislumbrar o quão violento pode ser tudo isto. Desde o amor ao aceitar a instalação de dores novas e permanentes.

É precisa coragem, sim senhora. Vejo muitos pais adoptivos dizer que se sentem ofendidos quando alguém lhes gaba a coragem. Compreendo ao que se referem: a coragem das crianças é ainda maior do que a nossa. Mas esta não deixa de ser também uma coragem.

Se as queremos distinguir, chamemos-lhe coragem major e coragem minor, então.

Sim, a coragem dos nossos filhos é major

Caramba, imaginem-se: ok, achámos que aquelas pessoas não sabiam amar-te e cuidar-te devidamente, trouxemos-te para esta casa e agora que te sentes seguro aqui vais embora e viver com estes senhores, que não conheces de lado nenhum, mas a quem vais chamar de pai e mãe, e que têm mil sonhos e expectativas para o que querem que tu sejas enquanto filho deles.

É isto que acontece. Por mais conscienciosos que tentemos ser, vamos também com a nossa bagagem de expectativas. 
E deve ser mesmo muito brutalmente assustador para uma criança e, sim, a coragem deles é maior do que a nossa.

Nem por isso, a nossa deixa de o ser. Eu, que sempre achei que encarava as emoções de frente (hahaha) e que sempre gostei de dar nome às coisas para procurar compreendê-las, tenho levado com cada safanão emocional que até fico a ver estrelas.
Enfrentar as dores dos nossos filhos é coragem, sim. É uma bela coragem e a minha vida é bela acima de tudo por causa da coragem que os meus filhos necessitam de mim. Não estamos curados da vida, nunca estaremos, mas caminhamos juntos e com coragem para o que der e vier.


Deixo-vos com um excerto a que volto muito.

«Deitei-me no chão, e não é fácil. É preciso ter sido queimado por muitos nomes, ter esquecido e relembrado a delicadeza, o sangue, a ironia, paisagens e transmutações, as formas, as vozes. Como se pudéssemos existir sem qualquer herança, com a fortuna apenas de um tesouro criado pela solidão. Deitado na terra, respiro contra o chão vivo; e como estou com a cara muito junto ao chão, o sopro bate na terra e volta-me à cara. É ainda assim uma bela coragem.»
.
Herberto Helder in Photomaton & Vox


Cipreste



sexta-feira, 20 de novembro de 2015

o meu melhor

Faço o meu melhor, ainda assim, às vezes, o meu melhor não chega.
Falho. Entro na minha espiral de pensamentos. O que fui fazer? O que fui dizer?
Apocalipticamente, imagino os meus filhos, já jovens adultos, num divã-psi com patrocínio dos meus métodos de parentalidade. Métodos? Reacções. Pois. Falho.
Amo. Sei que amo. Procuro solucionar-me entre expectativas, convicções (malditas!) e factos (o que é a verdade?). Amo e falho. Falho com aqueles que mais procuro proteger e amparar.
Penso em Beckett à procura de saídas intelectuais para os meus erros. Dou de caras com a discussão sobre a eterna perda das traduções: fail é falhar ou errar? Erro?
Oh, céus, faço demasiada carga sobre os meus ombros e depois fico cansada para o amor. Ou antes, com medo. Às vezes, tenho tanto medo do amor. 

Será isso?
Não sei.

Hoje, sei que o papel de mãe transportou-me para:

- o lugar onde, cada vez mais, me interesso menos com o que “os outros” pensam de mim
- a mira daqueles que preferem disparar primeiro e perguntar depois
- o confronto com a solidão desta tarefa
- a necessidade de abdicar de algumas das minhas utopias (não, Cipreste, nem todos os que dizem que te amam estão aptos a abdicar da sua arrogância para te ceder o benefício da dúvida; e tu, estás apta para fazer o mesmo no sentido contrário?))
- a necessidade de me sentir mais limpa, mais livre, com menos objectos, com mais presenças, com compaixão (tenho de apontar esta compaixão também para mim, eu sei, eu sei...)
- o saber, cada vez mais, pensar e respirar e contar (até mil, se necessário,) antes de reagir

É. Falho, mas sei o que não quero.

Não quero conflitos obtusos. Não quero levar com a agressividade passiva das frustrações dos outros. Tenho mesmo muito mais coisas (bem mais importantes e interessantes) com que me coçar e só sou mãe de dois.
Três, a contar com o Freixo, que (lá no meio das minhas inseguranças) descobri que está mesmo no lugar de filho no meu coração.
Ok, quatro, se contarmos com o gato :)

Bom fim-de-semana, 
Cipreste

p.s. obrigada por me lerem, obrigada pelo feedback que me deixam, não respondi ainda porque me faz sentir tão espantada, tão pequenina perante palavras tão generosas e companheiras. Tantas vezes, obrigada.

sábado, 17 de outubro de 2015

Sábado em Outubro

Um medley de Sábados de Outubro

Finalmente, Sábado. O Sábado exige nada menos do que uma maiúscula. O Sábado suporta tudo. Ao Sábado, conseguimos tudo.
Resta decidirmos entre ficar na cama ou fazer tudo.
Estou indecisa.
Aqui me exponho: sabe-me bem a cama. É o melhor lugar do mundo.
Ouvir os miúdos no quarto deles a continuar o jogo de ontem à noite, daqueles livros maravilhosos que os nossos amigos M.S. - nossos eternos fornecedores de roupa, livros e brinquedos, nos deram.
São tão cromos os meus filhos, são tão maravilhosamente cromos. Quando não estão na escola ou a estudar em casa, ora brincam aos professores, ora escolhem jogos didácticos, ou, não sendo didácticos, encontram aprendizagens em tudo. Tão maravilhosamente cromos, os meus filhos. Estou na cama e oiço-os, ela descreve o sistema digestivo, eles riem de algo que não apanho. Estou na cama e oiço os meus filhos a rir. São bons amigos, tomara que assim continuem, penso. Na minha cama – o lugar onde posso fantasiar conciliações e utopias, o lugar onde me sinto genuinamente grata.
Espero que os miúdos venham ter à nossa cama.
Não existe lugar mais redentor do que a cama do Sábado de manhã, albergando a família toda, em diálogos desconexos de obrigações.
Por outro lado, a manhã do Sábado, quando passada do lado de fora das camas, permitem o resto do universo em possibilidades. Ou, então: o sofá.
O melhor que existe para aprimorar o cenário descrito acima é a passagem directa para o sofá. Seja com uma taça de cereais, seja com o resto do bolo de chocolate que sobrou das comemorações da data especial de ontem. Com leite frio e desenhos animados da RTP2.
E a confirmação de que certas opções acabam bem. Tivéssemos TV-Cabo e teríamos de lidar com diplomacias para a escolha entre aquilo que consideramos minimamente construtivo e as parvoeiras que vislumbramos nas poucas vezes que nos quedamos em tv-cartoons e quejandos.
Continuemos a viagem de Sábado: cama, família toda, parlapiê com paródia, sofá, leite frio, desenhos animados, e bolo de chocolate.
Agora o café.
Não é Sábado de manhã se não houver cheiro a café. Um grande sim com ponto de exclamação para o café.
Siga. Deveres da escola. Que é para estarmos descansados amanhã.
Ela tem o primeiro teste para a semana, História e Geografia de Portugal. Ensinei-a a fazer resumos, digo-lhe «Lembras-te do que fizemos com Português? Faz o mesmo para HGP.» e ela dá saltinhos de contente. Apetece-me dizer «A sério, Magnólia?!», com aquele ar de pré-adolescente ainda-não-enjoada que ela faz - «A sério… mãe?!» e dá ênfase a “mãe” ou “pai” consoante a situação, e lá vai, toda empertigada.
Dá saltinhos de contente por ter de fazer resumo da matéria de HGP. O pai vem dizer-me que o pequeno está frustrado porque teve 3 erros no ditado. Agora que experimentou o sabor de ter “Zero erros! Parabéns!”, tem de aprender a errar como Beckett. Segue uma conversa sobre a perfeição e sobre a espera por Godot. São tão maravilhosamente cromos os meus filhos.
Quem dera poder dizer que fui eu que os fiz.
Mercado Municipal. Mercearia, padaria e talho do nosso bairro. Encontrar o P e a J, a R e o Super-V para outro café na esplanada. Ligar à Je ao J, saber se estão por cá. Dar um salto ao mercadinho biológico. Fazer o tal panelão de sopa. Deixar a sopa para depois e decidir colocar queijo e pão e uvas e laranjas e água e vinho num saco, seguir para o parque depois de ligar à F e ao A para virem ter connosco. A Magnólia pede para levar o fagote e nós ficamos a olhar um para o outro sem saber o que responder. O fagote toma o lugar do nenuco. Seguir. Deixá-los andar descalços no parque, contra as crenças portuguesas sobre as constipações. Rir, comer, beber, dormitar. As mãos dele sobre mim, sempre as mãos dele sobre mim. À medida que se conversa, a minha pele acarinhada e eu a sentir-me amada, nunca mais abandonada e muito menos em Outubro.
Seguir para casa a meio da tarde, passar pelo centro comercial e comprar as sabrinas para ela. Não temos sapatos de Domingo que lhe sirvam e vai precisar para a audição. Pretas ou azul-escuras? Quem disse que preto ou azul-escuro é entediante? Ora, que parvoíce, penso enquanto escolhemos as azul-escuras e ela segura o saco, feliz com a compra.
Chegados a casa, enrolamos massa folhada com Nutella. Os croissaints (ou coraçãs, como ele diz) ficam prontos em 5 minutos.
Pomos a mesa para o lanche. Comemos. Ela diz que vai estudar fagote. Cada um pega em pequenas tarefas sabendo que o momento vai ser desse instrumento grave que entrou de rompante nas nossas vidas. Eu leio, ele responde a emails, o pequeno pega nos legos ou na enciclopédia de instrumentos musicais – continua a dizer que quer tocar tuba. Quer percussão e tuba. Ela prepara o fagote e começa. Dó dó dó ré mi fá mi ré dóóó. E nós acompanhamos mentalmente. O irmão manda bitaites acertados e nós dizemos-lhe que tem de ser a mana a perceber isso. Ela percebe, ela sabe. Continua, dó dó dó ré mi fá mi ré dóóó. É tão maravilhosamente croma a minha filha. Diz piadas relacionadas com o fagote. Falta pouco para começar a dizer piadas que nenhum de nós na família há-de perceber. Ri-se de si. Frustra-se com o som que não sai como quer. Repete e diz “outra vez”. E eu de lágrimas nos olhos. Poucas coisas comovem como uma criança que tenta e repete para ser melhor.
Acaba o estudo. Desmonta o fagote, limpa o fagote, arruma o fagote à medida que diz “o meu fagotinho”. Não é dela, é alugado. Um dia, quem sabe…
Digo-lhe que vi no facebook que no dia 11 foi dia do fagotista, mostro-lhe este vídeo. Os fagotistas são tão maravilhosamente cromos. Onde já se viu uma flashMob de fagote. Rio muito. Rio muito alto. (Não costumo rir muito. Ou costumo? Não sei. Acho que rio pouco.)
Chamo-os para o sofá, vou buscar o portátil, com um de cada lado, vemos vídeos alternadamente. Um de judo, um de fagote. Ele espanta-se com os judocas, ela faz reparos sobre a posição do queixo daquele fagotista. Puxamos a manta, começa a arrefecer e vemos a vinha-virgem à nossa janela, está a mudar de cor. Há-de ficar vermelha daqui a poucas semanas. Bela.
Ao final da tarde, as minhas amigas vão mandar uma mensagem a dizer que estão no café, para eu ir lá ter. Ele vai insistir para que eu vá. Nuns Sábados irei, noutros não. Está tudo bem quando os amigos esperam por nós.

É Outono, é Outubro, é Sábado. Para sempre, Outubro será um mês major. Por estes dias, assinalam-se muitas datas para a nossa família. 
Sofro porque é verdade que o meu pai já não me vai chamar com a sua voz. Sofro porque me custa cada vez mais a distinguir do sofrimento que vejo no dia-a-dia no meu trabalho.
Esta é a minha vida, sempre muito cheia, sempre muito rica. Cantada por Maria Bethânia. Eu a viver emoções non-stop.
Chegar-se-á a hora de jantar e ele vai dizer que, porque não lhe apetece fazer nada, não quer que mais ninguém faça e há-de buscar algo para comermos. Não nos apetece ir fora. Mas somos sortudos, embora faça contas e queira poupar, ainda podemos buscar um frango ou uma pizza. Temos muitos agasalhos.
É Sábado e faremos planos para visitar algum museu amanhã, ou almoçar com a avó de um lado ou os avós do outro. Temos saudades tuas, pai.
Às vezes, é preciso dizer as coisas a fingir na segunda pessoa do singular.
Fez 4ªfeira um ano do primeiro dia doutro resto da minha vida, fez ontem um ano que vi a fotografia mais importante da minha vida (dito assim mesmo sobre a importância) e fez um ano que tivemos uma falsa esperança de viver um pouco mais sem a dor persistente da ausência.
Hoje é Sábado. Vou ali viver e sonhar. Vou pesquisar o preço dos bilhetes para concertos de ano novo e sonhar com viagens que não faz mal que não possamos fazer, porque o Sábado é nada mais do que a lembrança do cuidar diário. O sábado é nada mais do que a celebração do que se construiu nos outros dias.

Bom fim-de-semana,
Cipreste

p.s. talvez dever-se-ia chamar este blog Outubro a Outubro ;) 

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Criar

Quando me dei com dois filhos no regaço não foi no amor de mãe que pensei, não foi isso que senti em primeiro lugar. Quando me dei com dois filhos no regaço foi a possibilidade o seu sofrimento que tomou conta de mim.
É óbvio que, se falamos de uma situação de adopção, estamos a falar de perdas específicas, mas não falo apenas do evidente sofrimento que se adivinhará a quem o percurso de vida familiar tenha sido interrompido precocemente. Falo do sofrimento natural e inerente a todos nós.
A primeira vez que me deparei com uma situação de stress da minha filha, com aquele corpo magro a tremer e ela a encostar-se a mim como se quisera entrar por mim adentro, senti que ia desfalecer, pensei mesmo que ia desmaiar. Quis fugir. Não era possível que o sofrimento daquele ser pudesse influenciar de tal forma a minha capacidade respiratória. Mas foi – é – possível.


Tenho dois filhos maravilhosos. São as pessoas mais corajosas que conheço. São pessoas de bem com a vida.
São os meus heróis.


O nosso início de vida foi como o é a vida no seu todo:implacável. Estávamos juntos há menos de um mês quando o estado de saúde do meu pai se começou a agravar até que nos deixou, ainda não havia passado dois meses da nossa vida em comum. Ao entrar numa vida nova e totalmente desconhecida com sonhos de serem um príncipe e uma princesa, prontos para viver felizes para sempre, os meus filhos vieram encontrar uma mãe em lágrimas.
Assim, a nossa vida começou com risos e choro à mistura, com conversas sobre o amor e sobre a tristeza. Afinal, não estavam ali apenas duas crianças de luto pela sua vida anterior, mas uma família inteira de luto.

Dou comigo, assim, no lugar em que me questiono como posso criar os meus filhos para saber estar de bem e conviver naturalmente com o sofrimento próprio da vida. Sinto, assim, que a dimensão do amor pelos filhos não passa, para mim, por descrições cor-de-rosa sobre como seria capaz de dar a minha vida por eles ou que os filhos é que vêm dar sentido à nossa vida. Aliás,sempre achei que existir para dar sentido à vida dos pais é no mínimo, e para começar, uma herança demasiado pesada para um filho.
Adiante.

Não deixo de ler o que posso sobre pedagogia, o que não é o mesmo que dizer que ando à procura da teoria acertada para educar. Para lá do ensino das boas maneiras à mesa, a educação para a vida nada tem que ver com discursos e é quando nos vemos mergulhados no meio destas emoções todas que damos verdadeiro sentido ao “educar através do exemplo”.
É óbvio que temos desejos para o tipo de pessoa que gostaríamos que os nossos filhos crescessem para ser, para além das suas essências próprias, mas nada mais do que o básico: ser boa pessoa, honesto, amigo, trabalhador, etc.


Passam 8 meses desde que a minha vida mudou para sempre – assim mesmo, com todo o dramatismo próprio à frase que acabo de escrever. 
Assinalo os dois grandes marcos desta viragem da minha vida: a confirmação de que a aprendizagem sobre o bem-querer vem do bem-querer ele próprio e não de palavras vãs, precisamos de actos coincidentes com as palavras; e a constatação de que o meu bem/mau-estar vai estar para sempre a passo com o destes dois seres maravilhosos que entraram de rompante na minha vida.

Este texto que linko resume o que tentei dizer neste post, de uma forma que receio ter sido atabalhoada mas que penso ser útil na partilha de experiências e dúvidas que cabem a muitos de vós que estão deste lado comigo. Acima de tudo, é sobre a nossa capacidade de luta contra o sofrimento de um filho quando percebemos e aceitamos que a vida (também) é sofrimento e que é possível conviver e rir com ele sem ter de decretar derrotas antecipadas à morte – pois esta é a única coisa que não tem remédio.

Brian Rea

«The most optimistic people often struggle the hardest. They can’t quite square what’s going on in the world with their beliefs, and the disparity is alarming.
(...)
In retrospect, my poetry project was a harmless sideline that kept me benevolently out of her way as she struggled not just to see the horizon but to march bravely toward it.»




Cipreste



quinta-feira, 2 de julho de 2015

8 meses

Tenho tanto para vos contar que é difícil decidir por onde começar. Os últimos 8 meses foram muito intensos - tão difíceis e tão especiais. Resolvi começar com isto que escrevi e dediquei à minha família no dia em que entregámos no Tribunal de Família e Menores a petição para a adopção plena dos nossos filhos. É uma espécie de exercício em forma de resumo poetico-prático:


Superior Interesse do Amor

Outubro
O telefone tocou
Magnólia e Chaparro Júnior
A hora em que nos vimos pela primeira vez
Papá, mamã
Filha, filho

A vinda para casa
A primeira noite
O primeiro choro
A primeira dor
O primeiro dia de escola
O medo a instalar-se dentro de todos nós

Novembro
Conhecer o mano mais velho e a paixão imediata
Viva a capacidade de amor das crianças
Tios, primos, avós – e a última fotografia tirada com o meu pai
E o resto da vida a acontecer
O primeiro internamento do avô, duas semanas após estarmos juntos
Prepararmo-nos para o pior
Disse o médico
Preparar a rede para o pior
Conhecer a família alargada
Conhecer os amigos dos pais

Os primeiros recados na caderneta dele
A primeira chamada da professora à escola

Dezembro
O segundo internamento do avô
A dor dos dias seguintes
O testemunho do último suspiro do meu pai querido:
Adeus, paizinho,
Não vás, por favor, não vás
Até sempre, paizinho

O pai que os foi buscar ao campo de férias do Natal e lhes disse
“O avô foi embora, nunca mais vai estar connosco”
E a dor dos dias seguintes
O funeral a assinalar o nosso aniversário de casamento
As datas, sempre as datas
Ficarem ao cuidado da família alargada, sem ainda terem estado longe de nós
Os dias seguintes
O meu aniversário e um bolo absurdo com velas
E o Natal mais triste de sempre
(Era para ser o Natal mais feliz de sempre)
O Natal mais triste de sempre
As datas, sempre as datas
E os foguetes de ano novo que se ouviam
Na casa onde o silêncio reinava entre as nossas lágrimas
As datas, agora a contar para trás no que é a memória do meu pai

E o resto do mundo, ingrato, que não parou solenemente

E um Inverno duro e confuso
Os dias mais confusos de sempre
Cheios de medo e incompreensão

A questão: como era possível que aquilo fosse o resultado da minha busca de vida

Janeiro, Fevereiro
Tanta dor
Tanta força a ser necessária
E o amor a tentar pôr-se em bicos dos pés
E os dias com as suas coisas práticas a intrometerem-se
Era necessário assegurar
Refeições, roupa, trabalhos de casa, educação, regras, estabilidade
Amor

E a negridão a aproximar-se para dentro de mim
(Mas o amor já estava em bicos dos pés)
E precisar de ouvir: estão a fazer um bom trabalho
Precisar de votos de confiança, receber silêncio e ausências
Eu caio
E, um dia, receber uma carta generosa
De uma pessoa inesperada
(És uma boa mãe)
Guardar essa carta como um tesouro
E dar graças pelas pessoas bondosas
Levanto-me e grito
Deixo de precisar daqueles que não fazem um extra mile
Nem geográfico, nem emocional
Hoje e para sempre
Contar comigo e com o meu amor
E com as pessoas bondosas

Compaixão e saber perdoar

Março
Dizemos em voz alta: somos um rochedo
«Somos um rochedo.»

O primeiro dia do pai
E o amor
«O amor.»

Abril
Ele faz anos
Nós desdobramo-nos para lhe mostrar: amamos-te
Muito
Três festas: uma no dia, com os amiguinhos
Outra no Sábado seguinte, com os familiares
E no primeiro dia de aulas após as férias da Páscoa
Três festas, três bolos
E ele segue, com o terceiro bolo, a caminho da escola
Com a ajuda do pai, e diz-lhe:
A mãe é uma pessoa amorosa a fazer bolos de anos.

Confirmo o meu sonho:
Ser uma mãe-sempre-em-casa
Mas não posso
Regresso ao trabalho
Regressam alguns pesadelos nocturnos
Resolve-se com dormidas a quatro
Madrugada fora
Viva a cama dos pais
Abaixo quem julga as opções alheias

Ainda Abril:
Os nossos corações dão de si
Libertos do medo
Serenos

Maio
O primeiro dia da mãe
E o amor
Recebo outra carta: dela
«Mãe», diz-me ela, «amo-te»
Duas páginas repletas de juras de amor
Trago-a comigo, para ler em momentos de medo

Serenidade em pleno
Nos corações
Todos
Nos nossos sorrisos
Nos abraços matinais
Viver, agora e para sempre
Até que a morte nos separe

Junho
Ufa, a canseira de final de ano
Somos, como suspeitávamos que iríamos ser,
Pais participantes, lavamos tachos
Servimos sardinhas no arraial da festa de fim de ano
E saímos da escola à meia-noite
Damos um duche a duas crianças felizes que se deitam
Consoladas
Para ter sonhos bons
Abaixo os pesadelos

Lemos cerimoniosamente, na petição ao tribunal,
Escrita com a ajuda da jurista da nossa equipa de adopção:
Superior Interesse da Criança
E choramos
Da solenidade e da verdade
Desta expressão escrita agora dentro da história das nossas vidas

Tantas primeiras vezes, verdades e erros,
Tudo junto e plenamente humano
No superior interesse do amor
Hoje e para sempre
Que a morte só há-de separar-nos dos nossos abraços.

Cipreste

faltam aqui as patinhas do Freixo :)

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Queremos regressar

Olá,
Estamos a tentar encontrar a forma mais confortável para regressar:
sim, já somos pais, pais muito felizes e orgulhosos.

Já cá voltamos para apresentar a nossa descendência.
Até já. Ou até logo.
Tenham paciência.
Agora fazemos tudo mais devagar.

Um abraço,
Cipreste e Chaparro


edit: ao publicar o post, percebemos que passam exactamente 8 meses desde a última vez que cá estivemos... ena!

terça-feira, 9 de setembro de 2014

a caminho de me tornar numa Schmuck colossal

Felizmente, é raro dar-me chiliques como o de ontem. Nessas horas, parece que, à minha frente, só existe um muro intransponível. Nessas horas, sinto-me próxima de um point of no return. Quando passa, percebo que essa sensação é falaciosa. Nem o muro é intransponível, nem, trespassando esse muro, chegarei a um lugar sem retorno.
Embora todos os tempos sejam sem retorno, e alguns lugares também, o retorno, aqui, surge mais como uma sobrevivência e não como um regresso. Ou seja, a única coisa que não tem remédio é a morte, ao resto, no mínimo, resistimos.
E, quando falo em sensação falaciosa, penso que se pode fazer uma analogia com aquilo que os antigos (provavelmente alguns contemporâneos também) chamariam de “espíritos maus”. Porque uma pessoa como que se sente possuída por uma força que nos impede de ver mais além, de perceber que há uma saída, que aquele momento é só isso – um momento.
São horas difíceis, horas de desesperança.
É uma implosão, consequência de idades sucessivas a fazer por escapar a torvelinhos.

Este fenómeno, a sua constatação, tem uma importância imensa na minha biografia. Vivi um episódio em que esta cegueira tomou conta de mim e me fez vivenciar um dos momentos mais negros da minha existência. Nesse dia, eu disse com todas as minhas forças “não consigo”. Toda a conjuntura à minha volta foi favorável a uma desistência. E eu desisti. Foi nesse dia que eu quis morrer. No entanto, vai uma distância entre achar que a nossa vida não vale nada e acabar com ela. Não fiz nada no sentido de atentar contra a minha própria vida. E continuei a respirar até me sentir gente de novo. Tudo porque me deixei tomar conta pela desesperança.

Sabemos que a vida não é estanque, sabemos que há dias bons e dias maus, ainda assim, nunca estamos preparados para as quedas. 

Quando eu era adolescente e nos sentíamos em baixo, dizíamos que estávamos na fossa. Parece-me uma boa metáfora. Há horas em que perdemos o Norte e nos questionamos sobre a própria inteligência ao evocar outras horas em que achámos algum sentido a isto. Relembrando o Mickey Sabbath, «Qualquer pessoa com alguma inteligência compreende que está destinada a levar uma vida estúpida porque não há outra espécie de vida».

Depois, há qualquer coisa que nos impele a seguir em frente. Conformamo-nos que é isto que temos e admitimos que há horas bem passadas. As sensações físicas sossegam, a aflição esvai-se. A humanidade que há em nós leva-nos à conciliação e damos por nós a seguir em frente. 

Não acho que o Universo ande a conspirar contra, nem a favor (já agora), a minha vida. Acho que somos uma cambada de acasos, mas não tenho como afiançar. Os dias enchem-se de acontecimentos aos quais vou encontrar sentidos e que uso para fazer ligações. Falamos do medo, somos uma cambada de medos que podemos ligar uns aos outros. Porque estamos todos no mesmo patamar de conhecimento sobre o mistério da vida.

Hoje, o Google festeja Tolstoi, autor de um dos livros da minha vida – A Morte de Ivan Ilitch. Podem ler sobre o livro aqui. Também concordo que cada página é como um espelho. E estou certa de que o relerei mais vezes. Preciso de me lembrar amiúde da nossa ignorância.

Ontem, uma pessoa que me é muito querida, que faz parte do meu bem-querer, partilhou este post no facebook com a legenda “me too”. Quando vi, fiquei em pânico. Fiquei aflita porque não posso ver que alguém se sinta na fossa, impotente, nesse mesmo lugar em que eu, ainda ontem, me sentira. Corri a dizer-lhe que vai ficar tudo bem, que são horas que devemos tentar fazer com que sejam pequenas, que devemos breathe in e breathe out e, logo-logo, you're gonna be alright.
Disse-lhe tudo o que o Chaparro me havia dito horas antes ao tentar ajudar-me.

Mais tarde, quando o Chaparro chegou a casa e lhe falei sobre tudo isto e lhe disse que já me sentia melhor, rematei, citando o meu amigo Sabbath, que, um dia, vou ser uma Schmuck colossal:

«As parvoíces em que temos de nos meter para chegarmos onde temos de chegar, a extensão dos erros que precisamos de fazer! Se nos informassem antecipadamente de todos os erros, diríamos não, não posso fazer isso, têm de arranjar outro qualquer, eu sou demasiado esperto para fazer essas asneiras. E responder-nos-iam, nós temos confiança, não te preocupes, e nós responderíamos não, nada feito, precisam de um schmuck muito maior do que eu, mas eles repetiriam que têm confiança que somos a pessoa indicada, de que evoluiremos para um schmuck colossal mais conscienciosamente do que podemos começar sequer a imaginar, de que cometeremos os erros numa escala que nem podemos sonhar agora: porque não existe nenhuma outra maneira de atingir o fim.»
in Teatro de Sabbath de Philip Roth
Publicações dom Quixote, Colecção Ficção universal, 2000
Gosto da palavra schmuck.

Cipreste

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

da boca dos outros

Bandeiras

Tenho aprendido pouco da vida. Não por falta de tabefes ou de atenção às lições, mas porque em nada disto vejo ciência exata e a fórmula que ontem deu conta certa hoje pode resultar em incógnita. De uma coisa, porém, me vou lembrando: que certos apegos são inúteis. Que o "abrigo", o "porto seguro", a "estrutura", a "terra firme" são conceitos fantasiosos, esculturas da nossa debilidade. Que o melhor é manter a disposição para mudar de rumo. Que não há casa que não possa desmoronar-se, caminho que não possa desembocar em precipício, dinheiro que não arda, vida que não tombe em sepultura. Caminhe-se com bons companheiros e vistas amplas, mas não se presumam apropriações, moradas definitivas, territórios cercados, contratos vitalícios.
É tolice espetar bandeiras num mundo que não para de girar.

por Mãe Preocupada

quinta-feira, 24 de abril de 2014

25 de Abril, sempre! Fascismo, nunca mais!

Outra vez, no bar do meu local de trabalho. Na véspera do 40º aniversário do 25 de Abril, ainda se ouve este tipo de conversas - «Hoje vinham dois sem-abrigo, da associação X, no autocarro. Iam para uma formação, mas todos bem vestidos. Com telemóvel e tudo, até headphones! E recebem 80€ por mês!» 
:( 
Respondi, claro (provavelmente, tenho de deixar de ir ao bar) - «Não lhes invejo a vida. Bom dia a todos.»

~ ~ ~

Hoje começo os meus festejos “oficiais” deste 25 de Abril que é da mesma idade que eu. Penso muitas coisas sobre ele. Ele é uma entidade para mim. Eu, herege, dou mais importância ao dia 25 de Abril do que ao dia 25 de Dezembro, e olhem que, embora ateia, gosto muito do Natal. 
Andam para aí uns energúmenos a perguntar se valeu a pena o 25 de Abril. É que isso não se pergunta, nem em forma de metáfora, ou antes, só aceito essa pergunta na bela obra que é o FMI do José Mário Branco. Uma obra que conheci em 2004 (dou agora conta que passam 10 anos) pelas mãos de uns amigos que conheci através da net. Oiçam, é lindo, às tantas o JMB pergunta se valeu a pena e responde de imediato: valeu, pois!

Valeu, sim. 

Desejo-vos um 25 de Abril muito bonito e inspirado.


Cipreste

quarta-feira, 5 de março de 2014

Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma*

Desci as escadas para almoçar e assim que sentei à mesa as lágrimas caíram copiosamente. O meu nível de frustração naquele momento estava muito elevado. Tinha acabado de passar por um momento de dor física horrorosa e esperava poder sentar-me sossegada com o Chaparro e o Freixo - que veio passar as mini-férias de Carnaval à sua segunda casa. Só queria um almoço em família, com o Chaparro a dizer disparates e eu e o Freixo a unir forças em desaprovação jocosa do seu comportamento, para que todos sentíssemos aquele calorzinho que se sente por dentro quando sabemos que estamos todos ali, que o mundo todo está naquela sala de jantar. E que nos pertencemos e que podemos contar uns com os outros daqui até ao céu. Mas caí em lágrimas. Um farrapo. E fiz do nosso almoço uma coisa preocupada e desalentada.
Já deitada no sofá, não me contive e pedi desculpas ao Freixo pelo almoço logrado e este, um querido, como sempre, disse-me que eu não tinha nada que pedir desculpas.

Não queria que este Carnaval tivesse sido em torno das minhas dores, mas não havia nada a fazer, elas ali estavam e o Chaparro deixou bem claro que íamos passar aqueles dias assim: em família.
Não vale a pena entrar em pormenores sobre o que aconteceu: uma desregulação que teve de ser regulada por “tentativa-erro” com medicação. Toda a violência física deste vaivém de hemorragias e dores levou-me a um estado de labilidade emocional que me assustou. E nessas alturas não há nada como nos deixarmos à mercê da protecção da família e dos amigos íntimos porque o resto da humanidade apresenta-se-nos muito hostil nessas horas.

Hoje voltei ao trabalho e pude fazê-lo devagarinho, o que me soube bem. Fiz daquelas coisas que nos deixam o sentimento de missão cumprida para o dia. Foi gratificante. É assim em muitos dias da minha lida e ainda bem que o foi hoje. Acrescente-se-lhe o calor e o cuidado com que me receberam de volta (só estive 6 dias ausente!). Foi tudo muito conciliador.
Porém, nem por isso senti menos vontade de vir para casa descansar. Embora as considere insignificantes, as dores ainda andam por aqui e tanta imensidão de existência humana com que lidei hoje deixou-me muito cansada.

E eis que chego ao tema cansaço.
Eu sei. Eu sei o que se passa. Não vou tentar fingir. Nem fugir.
Não foram apenas as perdas de sangue e uma eventual anemia (que não chegámos a avaliar) nem só o cansaço disso tudo que me trouxe a este estado de fragilidade.

Sou demasiado consciente dos meus processos para virar a cara para o lado, no entanto, às vezes demoro um bocadinho a formar uma linha de pensamento sobre o que se está a passar comigo. Agora reconheço o que se passa e tenho de me organizar para aceitar as feridas que estão em mim. E quando falamos de feridas, falamos de friabilidade e neste momento tenho de ter cuidado ao lamber as minhas pois não as quero em carne mas antes a sua cicatrização. E eu sou daquelas pessoas que aceita que as cicatrizes devem ser acarinhadas e servir para que nos lembremos - sempre. Não acredito que haja uma solução para se ir da ferida à pele intacta. [receio ter-vos proporcionado mais um momento de metáfora barata(?)]

Posto isto, tive de dar a mão à palmatória e adiar uma série de compromissos. Consegui reformular todos, felizmente. Custou-me especialmente um compromisso profissional que implica com a vida de uma pessoa especial, mas também sei que quando o retomar será comigo mais completa para assumir as competências que me são devidas.

E depois há outra coisa, só para tentar complicar decisões sensatas: sabem aquelas pessoas que não sabem parar? Pois, eu sou daquelas que ficam a remoer e a pensar que é um exagero, que afinal conseguiria dar vazão aos compromissos todos e tal. Mas felizmente tive um momento de lucidez quando assumi que não. E hoje senti que o esforço de ir trabalhar com tudo de mais mundano que implica - desde o acordar bem cedo, arranjar-me, ter energia para empatizar com pessoas cheias (cheias) de problemas, é o esforço que posso fazer.  Adiante.

Ao lusco-fusco, só quero cair nos braços do meu querido Chaparro e fazer tudo o resto o mais devagar possível. Sem grandes planos, segurando as pontas àquilo que não vale a pena abandonar, procurar olhar para as coisas vendo-lhes a beleza possível sem fazer um drama de cada vez que me der para o choro. 

É um grande rol que enfrento neste momento. O luto pelo sonho de gerar um filho. O luto do que implica uma histerectomia radical, aos 40, como descerrar de uma história de infertilidade. A luta do meu pai. A luta pela minha saúde, pois a cirurgia que aí vem ainda me pode trazer dissabores assim como não me garante a cura da endometriose, e a vida com a medicação e efeitos secundários de uma histerectomia radical.

Para já, o que se passa comigo é isso - a vida, e a minha é tão cheia de coisas boas que me parece que as más acabam por ser na mesma proporção advindo daí esta intensidade de mágoa.

Para já, batalharei com uma das minhas armas mais fortes: o amor pelo qual estou rodeada. Donde tenho de salientar a incondicionalidade e o orgulho com que o Chaparro se apresenta lado-a-lado comigo.
Sou uma felizarda.

Cipreste


Fulfillment, Gustav Klimt



* Miguel Esteves Cardoso via Citador

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

And sometimes we think we are not ok but really we are

Queria conseguir dizer do impacto que isto tem tido na minha vida, mas não sei se consigo. De cada vez que começo a teclar sobre esta moléstia, começo a chorar e não consigo avançar. Apago tudo e vou fazer outra coisa qualquer. Geralmente essa coisa qualquer é comer chocolate. Embora saibamos que a nossa necessidade de consolo é impossível de satisfazer, um chocolate é um chocolate é um chocolate. Mimo, precisamos de mimo e de compreensão. E eu tenho isso. Tudo. E nem assim posso considerar que lido bem com isto. E daí, o que será lidar bem com isto? Um chorrilho de lugares comuns construídos na base da culpa judaico-cristã, é o que vos digo.

Cenário: passar-se mal todos os meses desde os 14 anos (menarca aos 13), muitos dos meses tendo de recorrer ao hospital para controlo da dor, sofrer hemorragias imensas, ter anemia, chegar à estação em que se planeia engravidar e os meses e os anos passam, sem filhos, mas com dores. Queixa-se de não ter filhos e ainda por cima ter dores e ter de ouvir a besta o diplomado em medicina a dizer “Não sei porque se está a queixar, 70% das mulheres férteis queixam-se de dores menstruais.”. Onde diabo terá aquele energúmeno diplomado em medicina ido buscar aquela estatística?

Após o 4º médico e mais 12 anos, alguém propõe um diagnóstico pela primeira vez: ENDOMETRIOSE.

Então, isto tem nome? E não é normal, é uma doença? Não é um tanto ou quanto exagero chamar-lhe doença? Agora que me habituei a dizer que é normal. Afinal, são só dores e hemorragias incapacitantes e causa de infertilidade.

Começam agora a ver onde encaixa o chorrilho de lugares comuns construídos na base da culpa judaico-cristã?

Fomos convencidas durante anos de que as nossas condições são nada mais do que a paga por sermos mulheres. No meu caso, mais de metade da minha vida tem sido marcada pela endometriose. Façam contas, sou uma quarentona (enxuta!) e comecei nestas andanças aos 14. A primeira vez que acordei com dores não fazia a mínima ideia do que se passava comigo. Tenho tão presente essa madrugada, a minha confusão sobre o que sentia, decidir se deveria acordar os meus pais, a ida ao hospital e o alívio após a medicação. E nunca mais parou. Quer dizer, intervalou há cerca de 15 anos após uma intervenção cirúrgica por laparoscopia, mas voltou passados uns anos.

Gostava de dizer com toda a certeza que eu não sou endometriose nem a endometriose toma conta da minha vida. Mas receio não o conseguir dizer sendo totalmente honesta. A minha biografia está muito habitada por esta maldita. Tive um casamento anterior que foi muito marcado para o final devido à questão “filhos” e esta questão não pode ser separada da questão endometriose. As dores já me inibiram demasiadas vezes de socializar e de trabalhar. Após os últimos tratamentos, à procura de uma gravidez, piorou exponencialmente e agora as minhas dores não se resumem ao período menstrual. Agora não há regra, é quando lhe apetece, e onde lhe apetece. E com a intensidade que lhe apetece. E isto cansa.
E isto cansa tanto.

Já não se trata de brincar com o Síndrome Pré-menstrual, é um ciclo non-stop. Não sei com o que posso contar. Passo umas semanas sem dores, passo as semanas seguintes com dores. Faço pílula contínua mas tenho hemorragias na mesma. Vou na terceira semana. Com hemorragias e com dores. E isto cansa.

E dou por mim a calçar as sapatilhas hoje de manhã para ir para o trabalho enquanto faço contas a quantas horas faltam para regressar a casa e deitar o corpo. E dou comigo em lágrimas e a afligir o Chaparro e a pensar que merda quero sentir-me melhor, com mais força. Sem dores e com mais força. A minha cabeça está activa e não pára, quero que o meu corpo corresponda, mas ele responde-me que estou cansada e que só o quero deitar. E tudo fica tão difícil e sinto-me a perder o chão e já sei que me vão perguntar o que tenho e só me vai apetecer fugir.

E isto cansa tanto.

Porque tem o resto da vida toda à volta.
A espera pela convocatória para a cirurgia. Já vos disse que o veredico de 3 médicos para o meu pecado de endometriose foi a histerectomia radical?
A nova etapa do meu pai. Mais um tratamento, paliativo e não curativo, já sabemos senhor doutor, mas não queremos saber e repudiamos isso tudo, isso tudo, isso tudo. O meu pai está bem, muito obrigada. O meu pai está bem.
E o resto da vida toda à nossa volta.
E o nosso amigo que emigrou com uma situação incerta e dizermos uns aos outros que vai correr tudo bem. Que preocupação.
E a nossa casa a ser feliz em preparação para o nosso filho ou a nossa filha ou os nossos filhos ou as nossas filhas, para a equipa de adopções aprovar. Para a equipa de adopções aprovar. Porém a equipa nunca mais chega, porque as equipas de adopções também têm baixas no pessoal, mas nós temos tanta dificuldade em compreender como é que um processo de adopção pode ser adiado ou atrasado ou lá o que é por falta de pessoal. E não compreendemos e ficamos com medo que o nosso filho ou a nossa filha ou os nossos filhos ou as nossas filhas estejam já à nossa espera e nós que nunca mais chegamos.
E nós que nunca mais chegamos.

E o resto da vida toda à nossa volta.

E ter energia para aplicar técnicas no nosso trabalho e conseguir ter uma palavra amiga para os clientes.

E querer chegar a casa e deitar o corpo. Vemos um filme num dia e choramos. Vemos outro filme noutro dia e já sabíamos que íamos chorar. E choramos uma vez mais.

cena final do filme Monster's Ball,
em que se come gelado de chocolate  :)
e ouvimos We're gonna be alright
E chega o dia em que dizemos não. Não. Dizemos não à forma como estas dores e estas feridas estão a tomar conta de nós. E arranjamos forças e vamos a pé para casa.  E pensamos eu não sou endometriose nem a endometriose toma conta da minha vida. Fazemos os cerca de 4 km a pé e recebemos o vento no rosto e lembramo-nos que temos o fogo dentro de nós*. E sentmo-lo - ao fogo, e pensamos: we’re gonna be alright.


E depois dizemo-lo em voz alta no meio da rua e não importa quem passa. We’re gonna be alright.
Assim que entramos em casa, cai uma tromba de água e sorrimos e repetimos as palavras da nossa querida amiga: And sometimes we think we are not ok but really we are.



* referência a A Estrada de Cormac McCarthy
Cipreste

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A vida é chorar e rir a vida inteira*

Tenho muito para vos dizer, muitos assuntos sobre os quais quero falar. Uns mais imediatos, outros mais generalistas. Mas os dias têm andado tão a vida é chorar e rir a vida inteira que me sinto francamente avassalada. Eu chego lá, eu sei que chego a um patamar mais funcional de novo, agora é preciso chorar e rir, tudo ao mesmo tempo e afincadamente, para depois continuar a chorar e a rir o resto da vida, da vida inteira.
Imagino que vos pareça incompreensível este recado, mas é o melhor que consigo neste momento.
Hoje é dia dos namorados - St. Valentine's Day, e não vou ser uma hater, vou ser canadiana de tipo "dia Hallmark" e dedicar isto ao meu amor, o meu querido (querido!) Chaparro. Não poderia imaginar amor maior na minha vida. Não poderia imaginar sentimento maior de paixão  e conforto, tudo ao mesmo tempo, de verdade, de uma verdade incondicional. Obrigada, meu amor.

Will you be my Valentine, Chaparro? 

Da tua,
Cipreste

Isto, com as devidas adaptações ;-)