segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

à minha mesa

Ora aqui está mais um assunto sobre o qual tenho opiniões, é mais forte do que eu, as opiniões brotam-se-me dos poros :)

Nas nossas cozinhas, todos temos a mania de que somos um pouco nutricionistas, não é? Nem damos conta das ignorâncias que dizemos e a ignorância é muito atrevida, eu sei :) Aqui vai!...

Antes de avançar para a alimentação das minhas crias, deixo o meu testemunho pré-maternidade sobre a relação alimentação saudável versus peso/estatura.

Tive uma depressão há cerca de 15 anos que, juntamente com o tratamento medicamentoso, me provocou uma anorexia que me fez perder 18 kg, passei dos 72kg para os 54kg. Simplesmente, os alimentos não desciam. Passei assim de ser bom-garfo a uma enjoada. Segundo uns, estava magra demais, segundo outros assim é que estava bem.
Adiante, com o resgatar da minha pessoa a essa depressão, também resgatei o bom apetite que sempre tive e os quilos associados.
Gostei de estar assim magra, foi uma novidade e uma sensação engraçada, mas a verdade é que nunca fui infeliz com o peso anterior. Como todas as pessoas, sou mal resolvida nalgumas coisas sendo bem resolvida noutras. E, de facto, o peso nunca me fez sentir mal com o meu corpo – gosto dele. Porém, para mim, gostar do meu corpo é tirar prazer dele (e com ele) e comer faz parte desse deleite. Compreendo que para outras pessoas o prazer venha de assegurar o peso e a robustez que advém da privação a que não me sujeito, mas também não juro a pés juntos que alguma vez não o venha a fazer. Ou, então, fazê-lo motivada por alguma questão específica de saúde. Para já, essa não sou eu, mas também sei e concebo que mudamos.

Portanto, 15 anos depois, fora dos vintes e já dentro dos quarentas, passados tratamentos de fertilidade e histerectomia total com anexectomia bilateral, fazendo medicação diária de substituição, estou roliça, com formas, e não me sinto infeliz com o meu corpo nem se deu aqui nenhum clique que me diga que devia isto ou aquilo. Sinto-me bem. Não incorro na noção de que deveríamos encaixar num número que indica a massa corporal (IMC) que deveria ser o desejável para mim. Aliás, isto é toda uma outra conversa, a origem das tabelas IMC é muito mais sobre economia do que sobre saúde.

A única coisa radical que fiz por mim, pela minha saúde, foi deixar de fumar numa base diária. Mas agora não vou falar disto porque também dá pano para mangas, o assunto quente hoje é a alimentação (saudável).

O que é alimentação saudável? A quem a dirigimos? – Este assunto pode mesmo tornar-se uma obsessão como refere o texto.



(abrir imagem para melhor leitura)
Diário de Notícias de 22 de setembro de 2015

Falemos, portanto, enquanto gestores das nossas cozinhas e dos outros destinatários do que compramos e cozinhamos.

Quando éramos só nós dois (o Freixo não vive connosco), não havia regras. Nuns dias cozinhava, noutros não, sendo que nos dias em que não cozinhava ora petiscávamos ora íamos buscar fora.


O processo que me deram a ler com a descrição dos meus filhos, antes de os conhecer, tinha uma lista das suas rotinas de alimentação e preferências respectivas. Cereais ao pequeno-almoço (com direito a “estrelitas” à 4ªfeira e cerelac ao Domingo), sopa, segundo prato, fruta e pão ao almoço e jantar, pão e iogurte ou leite (a Magnólia com quantidade a dobrar) aos lanches. A fruta resumia-se a pêras, maçãs e laranjas. O pão com manteiga ou marmelada. A Magnólia vinha descrita como não gostando de carapaus (hoje adora!), feijão verde (na sopa, vai) e cenoura crua (continua a recusá-la) e o Chaparrito não trazia nenhuma recusa em especial.

No dia em que os conhecemos, a Magnólia entregou-me duas folhas cheias de recortes de supermercado com as comidas preferidas de ambos e comidas que desejava provar.
Ainda hoje estas folhas estão no nosso frigorífico. E já provaram dos tais alimentos.


Não tendo regras prévias, ainda assim sempre tivemos as nossas convicções. Prendem-se mais a uma forma ética de vida do que à nossa saúde em especial. Sei que a afirmação pode parecer incongruente, mas vou explicar.

A nossa alimentação baseia-se essencialmente nos princípios da mediterrânica, com as devidas ressalvas culturais e sem fundamentalismos. Por isso, acho que não deve haver demasiadas veleidades quanto a esmiuçarmos e controlarmos todos os alimentos que ingerimos. Não será a mais saudável, mas será certamente equilibrada. Um pouco de cada, sem exageros, é a nossa regra principal.

Vejamos, por exemplo, a situação da alimentação de origem biológica. Por vários motivos, sendo o nosso rendimento o principal, não consumimos produtos exclusivamente de produção biológica. Tornar-se-ia incomportável para nós. Gasto uma média de 20€ em fruta por semana. Vejamos o preço da pêra rocha no site do continente, a pêra de origem biológica custa 3,49€/kg, as “outras” custam 1,29€/kg, são mais 2,20€ por kg. Se fizer uma “regras de três simples” passaria a gastar 54,1€ de fruta por semana, ora 80€ para quase 220€ vai uma diferença abismal.

Por outro lado, damos preferência a produtos de origem animal provenientes da agricultura biológica. Consumimos cerca de 12 iogurtes “sólidos” e menos de 6 iogurtes líquidos por semana. Vejamos o preço no site do Jumbo (não encontrei no do continente), 6 iogurtes “sólidos” Agros bio de morango custam 2,39€ e 6 iogurtes “sólidos” Danone (dos poucos com leite nacional, pesquisem isto...) de morango custam 1,71€ (tive de fazer contas, pois vendem embalagens de 4 a 1,14). É uma diferença de 10ct em iogurte, em 12 iogurtes numa semana são 1,2€, tudo bem. O mesmo acontece com a manteiga. A diferença é maior no leite e nos ovos, mas fizemos a opção e vamos mantendo-a.

Ou seja, nem tanto ao mar, nem tanto à terra.

E onde entra então a minha afirmação “as nossas convicções prendem-se mais a uma forma ética de vida do que à nossa saúde em especial”? Tentamos consumir produtos que tenham origem o menos possível no sofrimento dos outros animais, de seres sencientes. Tanto quanto sabemos, as pêras e as pereiras não sofrem como sofrem as galinhas e as vacas, se as vamos explorar que, pelo menos (e enquanto consigamos os €€€) que venham de animais que vivam minimamente condignamente – mesmo considerando que os estamos a explorar “na mesma”.
É isto.

Gostávamos que todos pudessem comer alimentos de origem não manipulada, nós incluídos. Por enquanto, compramos uns vegetais biológicos aqui e ali, mas não fazemos disso um objectivo.

Mesmo sabendo que muitos outros produtos que consumimos – desde as tintas que revestem as nossas casas aos medicamentos que tomamos, têm origem no sofrimento de animais, vamos tentando minimizar esse impacto. Os nossos filhos sabem disto, não tentamos santificar este consumo, mas também não o usamos para branquear. Fazemo-lo com sentimento sincero.

Já a carne, não a consigo comprar de origem biológica pois só encontro congelada e em quantidades que não desejo.
Na verdade, comemos cada vez menos carne. Raramente vou ao talho. Cerca de 1 vez por mês o meu sogro dá-nos um saco de carne e fica sempre a sobrar no congelador. Tentamos também diminuir a quantidade de peixe. Percebemos a necessidade dos vários nutrientes, mas também percebemos que consumimos proteínas em excesso. Não fugimos aos hidratos de carbono porque procurámos compreender a sua importância – os nossos fígados e pâncreas agradecem.

Os nossos pratos são coloridos. Os meus filhos pedem-me “posso comer mais vagetais, mamã?” e o meu peito fica muito cheio, muito quentinho e consolado do prazer deles com coisas boas. 
tabuleiro de bacalhau, com abóbora e curgete (e outros legumes) a substituir a batata
antes e depois da broa por cima, com azeite - vai ao forno - simplesmente adoram!
Levamos os nossos filhos ao MacDonalds, sim, para aí de 3/4 em 3/4 meses. Muito de vez em quando deixamos comer gomas. Se tiver de ser, damos preferência a um chocolate (e tenho sempre uma barrita em casa) – o chocolate começou a pesar-me na consciência desde que soube a origem de trabalho no cacau, além de o ter diminuído drasticamente (sou chocolatoólica) quero começar a optar pelo de origem conhecida.
Só compramos refrigerantes – sim, consideramos os néctares como refrigerantes, os únicos que compramos (e da marca Compal, porque não é o mesmo que marca branca) – quando o rei faz anos.


Este é o nosso dia-a-dia em refeições:

Pequeno-almoço
1 taça de cereais com leite
- uma mistura feita por mim, com cereais da zona dos "dietéticos", atractiva visualmente para eles, e que me satisfaz nos níveis e na origem dos açucares, geralmente com arroz ou millet tufado simples e com cacau, trigo integral tufado simples e com mel e flocos de cevada integral (fujo do milho)
1 banana

Lanche da manhã
1 pão com manteiga/marmelada/queijo/doce de frutos vermelhos (às vezes, à 4ªfeira, com nutella, sim!)
1 pacote de leite branco (infelizmente não vendem do biológico)
1 maçã/pêra (para ela)

Almoço
Sopa (sempre)
Prato de carne/peixe/ovos
Fruta – ao almoço geralmente são citrinos
Água

Lanche da tarde
1 pão com manteiga/marmelada/queijo/doce de frutos vermelhos (às vezes torradas)
1 iogurte sólido (ela lancha na escola 2x/semana, leva iogurte líquido)
1 ou ½ maçã/pêra

Jantar
Sopa e um pouco de pão e queijo
Ou
Prato simples de legumes salteados ou ovos (quiche, por exemplo) ou uma pizza caseira (massa caseira) só de tomate e queijo, também uso muito o grão e comecei recentemente com as lentilhas.
1 ou ½ maçã/pêra

A fruta vai variando e fazemos provas de frutos vermelhos ou tropicais.

Não damos lanche da noite, o tempo entre o jantar e o deitar não o justifica. E eu já li demasiadas coisas sobre a Doença de Refluxo Gastro-Esofágico para andar cá com ceias à base de lacticínios em crianças maiores de 3 anos. Quando se deitam mais tarde, como ao fim de semana – ao invés das 21h30, passa para as 22 ou 22h30, pode haver um lanchinho mas fujo ao leite.

Como snacks fora da refeição, temos a fruta como opção privilegiada, queijo, iogurte e bolacha “pipoca” (que opto sempre por arroz e não milho, para fugir aos transgénicos e ao preço dos bio). Às vezes, compro um bolo de tipo folar e vai-se comendo também.

Compramos pão de mistura, o Chaparrito pede muito pão de sementes para a escola.

Quando a minha mãe está connosco, a nossa alimentação não é a mesma. Não tenho coragem de pedir à minha mãe para não usar a sua margarina vaqueiro ou caldos Knorr (lá ficam no frigorífico à espera da sua visita seguinte). É assim que ela sabe e gosta de cozinhar e uma semana por mês não nos há-de dar cabo da saúde. Ela sabe das nossas opções porque são faladas à mesa, tem dificuldade em aceitar que queremos comer de forma mais leve à noite, mas lá vai percebendo que é uma convicção firme. E não digo à minha mãe que o que nos traz da sua horta não é biológico.

Aos fins-de-semana, comemos papas de aveia aos pequenos-almoços, estamos completamente rendidos. Com canela, maçã, pêra e iogurte para o Chaparrito e para o pai, com canela, banana, laranja espremida e iogurte para a Magnólia e para a mãe. De resto, conforme o programa do fim-de-semana, ora comemos mais saudável, ora fazemos uns abusos.

Por vezes, enquanto faço o jantar, o pai abre uma garrafa de vinho, corta um queijo seco que comemos acompanhado com orégãos e maçã às fatias e os meninos vão debicando no queijo e na maçã.

Vão experimentando coisas novas e vamos cozinhando juntos.
Há tempos, arrisquei um caril de legumes: adoraram! Faço muitas vezes, muito, muito leve.

Adoram abóbora e curgete. Passei a substituir, muitas vezes, a batata por estes legumes.

Fazemos um bolo, ou coraçãs de nutella ou panquecas (que passei a fazer só com banana, leite e farinha de trigo integral) de vez em quando. Temos uma lata de Nesquick que adicionamos ao leite como um miminho menos do que uma vez por semana.



Estou tranquila com aquilo que dou a comer à minha família. Falo na primeira pessoa porque usurpei a cozinha para mim e raramente dou espaço ao Chaparro, quer dizer, dou-lhe espaço todas as noites ... para que a arrume :) Mas partilhamos as mesmas convicções.

Acho que não padeço da tal ortorexia.
É bem certo que assumo que pensamos mais na alimentação do que os nossos pais pensavam ou, pelo menos, doutra forma. Mas não acho isso pernicioso. Talvez sofra de algo cujo nome não sei, mas não se prende tanto com a nossa saúde - que, já disse e assumi, procuro cuidar mas considero que não o faço exageradamente (ninguém é juiz em causa própria, por favor digam-me se este parlapié todo serve de prova de que sofro, afinal, de ortorexia)
 :)
É capaz que haja um nome para a maleita de sofrer de consciência em relação ao sofrimento alheio na origem daquilo que como, isso sim, assumo que sofro.

Enfim, em inglês chamamos aos meus problemas de consciência de “first world problems”.

Não faz mal.
É bem melhor do que o sítio onde me encontrava o ano passado. De licença de maternidade, entendi que deveria ter os miúdos a almoçar todos os dias em casa. Entre as mil emoções de se ser mãe de um dia para o outro, passei de “sem regras” a ter de providenciar 14 refeições principais por semana, fora lanches e quejandos. Catorze! Com sopa e tudo.
Bem, este foi o meu primeiro passo junto dos meninos, diminuir a quantidade de comida ingerida ao jantar: ou há sopa, ou há “segundo” prato.

Não foi fácil, mesmo para uma cozinheira como eu, que rapidamente engendro comida para 30 (a sério, essa sou eu).
Aliar a responsabilidade de alimentar duas crianças ao fazer de contas às portas do desemprego do Chaparro não foi fácil.
Subitamente via-me num sítio onde tinha medo que o dinheiro não chegasse para o dia de amanhã.

Olhava o preço dos iogurtes no supermercado e trazia os mais baratos dos mais baratos, procurava todas as promoções. Um dia, tive uma crise de tristeza no supermercado. Não foi uma crise de pânico (acho que só tive uma dessas na vida), foi mesmo de desalento. Tinha deitado os meninos e disse ao Chaparro que ia às compras, precisava de abastecer e também de apanhar ar.
Dei por mim num daqueles memes que povoam o facebook com mães a dizerem que ir ao supermercado equivale a uma noite de saída. Mas dessa vez não teve graça. Dei por mim cheia de frio, no corredor dos congelados, a colocar alimentos transformados (aos quais sempre fugi), dos mais baratos, no carrinho de compras. Tomei coragem de espreitar os ingredientes, coisa que evitava desde a chegada desta conjuntura a nossa casa, e lá os vi, àqueles estabilizadores e açucares maus todos. Deixei vir aquelas compras para casa.

Os meses passaram e o Chaparro tem tido encomendas de trabalhos que nos vão indicando mais x meses tranquilos.
Não somos pobres, fazemos contas.
Não compro roupa, ou raramente o faço. As minhas botas de cano alto foram compradas em 2007, comprei uns botins o ano passado, este ano não comprei calçado. Andamos todos bem calçados e bem vestidos, eu, o Chaparro e os nossos filhos. Continuamos a comprar livros, mas menos. Vamos a poucos concertos com bilhetes de valor considerável. Vamos ao cinema 2 ou 3 vezes por ano. Fazemos muitas viagens de fim-de-semana, onde gastamos dinheiro para o combustível, mas ficamos com família. Isto para dizer que temos para aquilo de que precisamos. Vamos a muitos sítios e fazemos muitas coisas, basta estar atento, há muitas coisas a acontecer e que não implica gastar 100€ por família. Estamos a poupar para uma viagem no Verão de 2017. Poupámos para um piano digital que comprámos a um preço simpático. Nada nos falta.
Comecei a fazer contas mais a sério, como vos mostrei acima e vamos decidindo… compramos leite biológico, 1€ mais caro em litro é muito, mas não compramos as pêras biológicas, pronto.

Quando se abre o nosso frigorífico, há comidinha da boa e muito variada.
E há sempre para quem mais chegar à hora do jantar.

Este é o equilíbrio que vamos encontrando.
Falamos destas decisões com os filhos.
Se um dia eles decidirem por outras opções que não estas, cá estarei para as experimentar com eles ou, pelo menos, para não as boicotar.


Não quero acabar este texto sobre alimentação sem a seguinte ressalva: os meus filhos nunca me verão desesperada a fazer uma dieta de emagrecimento. Tal como disse acima, não juro que um dia não decida que quero diminuir o meu volume, mas isso nunca (nunca!) será o mesmo que mostrar que não gosto de mim e do meu corpo, será, quando muito desejá-lo numa dimensão mais reduzida, mas nunca (nunca!) o será de forma a procurar o que o meu corpo não permita. É importante olhar para o lado, todos (todos!) os dias ouço alguém (e não apenas mulheres) queixar-se ou comentar o volume ou quilo a mais, não compreendo nem me encaixa esse stress. Esse stress não é o mesmo que cuidar, não me venham com tretas.

E a lição que prefiro dar aos meus filhos é: gosta de ti como és.


Noutro dia, falarei nas nossas opções no que concerne o consumo de produtos do cuidado do corpo, o desperdício e outros produtos biodegradáveis.


Bom apetite a todos é o que desejo.
E boa semana!
Cipreste

2 comentários:

Mamã iogurte disse...

Obrigado pela partilha!
Abraço!

Cipreste disse...

Obrigada por comentar :)