Tenho-me apercebido de uma coisa nova em
mim, uma viragem na forma como lido ultimamente com as coisas: uma vez
resolvida determinada questão, saio dela, faço quase como que um abandono.
Vai fazer dois anos que fui
histerectomizada (com anexectomia bilateral), que vivo sem dores, que disse
adeus à endometriose. Desde então, quase que abandonei a luta em grupo, o
apoio, a entre-ajuda. Eu não era assim. Depois vieram os meninos e eu pensava que
andava arredada do grupo apenas por causa dos meninos.
A semana passada comecei a reflectir sobre
a minha cada vez maior resistência e consequente incapacidade de lidar com uma
situação com a qual sou confrontada diariamente e me obriga a fazer das tripas
coração porque me traz sempre com a lembrança do meu pai.
E eis que... Eureka!
Percebi o que se passava.
Custou-me a chegar lá porque se trata de
uma viragem de tipo 180º.
Eu era aquela que enfrentava todos os
touros de frente, procurava pegá-los pelos cornos e não largava até os deitar
ao chão. E ficava ali a escarafunchar.
Mas uma pessoa muda. Pelo cansaço, uma
pessoa também muda.
Por exemplo, eu via os maiores dramas do
cinema e saía ilesa. Deixei de o conseguir fazer. Escolho muito bem o que vejo
porque os efeitos secundários ficam muito localizados, ficam no lugar da
angústia. E eu deixei de ter a mesma resistência à angústia. O que me traz em
gestão controlada da mesma.
As minhas avós chamavam à coragem para
enfrentar os touros de frente de “ter estômago”. Podemos dizer que as pessoas
se vão dividindo entre as que têm estômago e as que não têm estômago.
Eu fui sempre uma gaija com muito
estômago. Até profissionalmente fui sempre escolhendo as “piores” áreas de
trabalho no que concerne sofrimento.
Mas estou cansada. O meu coração pediu-me
tréguas.
Lembrei-me agora desta passagem, rápida e
aflita, d’O Fugitivo de Sérgio Godinho:
É
impossível
não é
possível
correr
tanto
e
pensar tão
lucidamente
o
coração
não
aguenta
a
cabeça também não
porque
tenta
ultrapassar os seus limites?
(oiçam, a sério, é boa demais esta obra)
É isto. Por agora, dei os meus 5cents para
determinados temas. Em muitos momentos, ultrapassei os meus limites. Foram
muitos eventos de vida traumatizantes em tão poucos anos. Preciso descansar, preciso de gerir a minha energia.
Sinto forças para estar no tema da adopção,
porque ainda tem muita água para passar por debaixo da ponte e sinto muito
estômago para a fazer escoar.
Sou solidária com todos os que estão nesta
luta da endometriose, na luta contra cada um dos sofrimentos, mas o meu
estômago não aguenta estar activa nesse lugar. Concerteza perco muitos momentos
de comunhão. Poderia participar com ideias, com trabalho de facto, podia
ajudar, mas não consigo. Há umas semanas, aproveitei uma oportunidade, um contacto, para passar a mensagem junto de uma pessoa "conhecida" e fi-lo, farei sempre este tipo de abordagens, mas acho que não consigo mais por agora. Importa assumir isto, acabar com o equívoco (meu e dos outros) sobre expectativas da minha eventual participação. Neste momento, não consigo. Um dia destes, quem sabe
possa voltar ao grupo de apoio.
Assim, fico-me pela adopção, onde há tanto para pensarmos e ver se fazemos algo mais concreto (na informação e apoio, por exemplo) nesta área (não sou só eu que sinto falta, pois não?).
Resta-me agradecer a quem faz da endometriose a sua causa, uma parte dos seus dias, e ajudar na sua divulgação.
Resta-me agradecer a quem faz da endometriose a sua causa, uma parte dos seus dias, e ajudar na sua divulgação.
Copiei integralmente a seguinte mensagem do site do site da Associação Portuguesa de Apoios às Mulheres com Endometriose:
No Sábado, dia 12 de Março de 2016, realizar-se-á, uma vez mais, uma marcha que pretende ter presente o maior número de pessoas possível, com o intuito de divulgar esta doença, que afecta tantas mulheres, mas que é ainda muito desconhecida e por isso mesmo, o seu diagnóstico é bastante tardio. Este ano o dia da Marcha não coincide em todos os países tendo sido dada a cada um a liberdade para escolher o dia que fosse mais conveniente para o seu país!
Em 2014, a nossa primeira marcha, foi um verdadeiro sucesso, contando com cerca de 200 pessoas. O ano passado ultrapassámos as 300 pessoas sendo um dos países em todo o mundo com maior adesão. Este ano queremos mais, muito mais!
Para se manterem a par de todos os preparativos para este grande evento, que este ano se realizará na cidade de Lisboa, por favor juntem-se à página do evento no facebook ou mantenham-se atentos ao nosso site!
Ajudem-nos na divulgação, ajudem-nos a ajudar. Juntem-se a nós neste dia tão importante que fará a diferença para muitas mulheres que por todo o mundo sofrem em silêncio sem um diagnóstico.
A participação no evento é gratuita mas para receber um kit de participação necessita de estar inscrito! Por favor façam as vossas INSCRIÇÕES AQUI
7 comentários:
Sinto o mesmo em relação à infertilidade. Vou mantendo contacto mas foi uma época da minha vida na qual não quero estar sempre a martelar. Chamo a isso desapego porque, curiosamente, muitas vezes não nos queremos desapegar daquilo que nos trouxe sofrimento. Como se estivéssemos a trair a importância que teve na nossa vida.
Sim, existem muita coisa a ser feita em relação ao apoio e esclarecimento em relação à adocao.
Mas eu ando nessa batalha desde 2003 (iniciei o meu processo em 1998, e em 2003 percebi quanto era importante não estar só nessa vivencia e reflexão sobre a adocao), e ainda hoje sinto que a maioria das pessoas só partilha, só reflete só ajuda, enquanto candidato à adocao. QUando passam a familia adotiva, a maior parte das pessoas...fecha-se e desparece. E afinal é ai que começam os grandes desafios que nos acompanharão nos anos seguintes (senão a vida inteira).
E ainda hoje reparo, que o grupo que dinamizo, é composto por um conjunto precioso de familias, mas mesmo assim a maior parte delas são familias adotivas atipicas.
Patricia
Como diz alguém que muito prezo "uma coisa de cada vez". É a atitude indispensável para manter o equilíbrio. Compreendo a sua atitude, o canalizar de energias, deve ser a isto que chamam "maturidade".
Beijinhos,
Teresa
é isso mesmo, Mãe Sabichona, na mouche
Concordo, Patrícia, isto dá pano para mangas, temos mesmo de nos sentar e conversar :)
tenho (como sempre) opiniões e "teorias" sobre esse fachar das várias famílias
Teresa, quiçá seja esse bicharoco :)
obrigada pelo comentário
Pois temos mesmo que nos sentar a conversar. ;)
Pois temos mesmo que nos sentar a conversar. ;)
e eu tenho de começar a responder aos emails :P
tenho a certeza de que nos encontraremos brevemente :)
beijinhos
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