domingo, 6 de abril de 2014

Merecer ser amado, cuidado, acarinhado




Vídeo por sugestão da Mãe Sabichona, a quem sou muito agradecida. 

Não resisti a fazer uma tradução-livre do "texto":

Por vezes, alguém magoa-nos tanto que deixa de doer de todo. Até que algo no faz sentir de novo. E depois volta tudo, cada palavra. Cada dor. Cada momento.
Como é que poderás alguma vez perceber de onde venho? Mesmo que perguntes. Mesmo que oiças. Não estás aqui, nem viste, nem sentiste. Tu não te lembras da minha história. Não caminhaste no meu trilho. Não viste o que eu vi.

O meu passado define-me. Isto é o que eu sou. Eu sou: invisível, sem voz, indesejada. Isto é o que eu sou, se é que sou algo.

Parece que a mesma coisa que me manteve foi a mesma que me levou abaixo. O mundo virou-se do avesso e a ordem desapareceu. Nada foi como deveria ser e uma tristeza dura preencheu-me a alma.
De forma cada vez mais profunda, afundei em mim mesma. E nada me conseguia fazer ressurgir. Encarcerada na miséria da minha vida. Perdida na dor da minha alma. Incapaz de ver a luz. Incapaz de ver a alvorada, de sentir, de ter esperança, de sonhar.
E assim os dias escuros continuavam a chegar, e as noites negros da minha alma não paravam. Parecia que era sempre de noite com pesadelos, e que nunca era de manhã. E talvez nos questionemos “porquê?”, mas na maior parte do tempo tentamos nem pensar nisso e tentamos escapar e sobreviver. E tudo o resto fica tão insignificante, a única coisa que desejamos é recuperar o que tínhamos. Como desejar que pudéssemos ver a nossa mãe a sorrir de novo. E ouvi-la a cantar aquela canção preferida que sempre nos acalmou. Ou, se não podemos recuperar a nossa mãe que, pelo menos, pudéssemos tomar conta do nosso irmão bebé. Porque sabemos que ele precisa de nós e que vai ter medo e sentir-se sozinho. E quem é que lhe vai agarrar a mão e segredar-lhe que vai correr tudo bem? E quem o há-de segredar a mim?

Sei que sou desamparada, dependente, desesperada. Mas o que acontece quando aqueles de quem precisávamos são os que mais ameaçam a nossa própria existência? Já ouvi muitas promessas, e todas soam ao mesmo. Se eu tentar o suficientemente, mais tarde ou mais cedo, todas as promessas provam ser vãs.

O sol nasce toas as manhãs, mas saberemos onde? Em cada lugar, é num sítio diferente. É difícil encontrar o norte quando continuamos a mudar, mas acabamos por encontra-lo. Ao menos isso. Habituei-me a depender disso. E devagarinho, devagarinho, as estações mudaram. E parecia que, desta vez, talvez o tapete não seria puxado por debaixo dos meus pés, de novo. Pés a salvo, raízes a começar a crescer, pequenos pedaços de esperança para mim. Devagarinho a tentar confiar nesta vida nova.
Desejo que alguém me diga que vai correr tudo bem. Que um dia, talvez, me sinta normal. E que não me sinta sempre sozinha. Que tenha uma mãe que me abrace e que seja forte por mim. Porque, talvez, eu não consiga fazer tudo sozinha.

Este é o meu passado. A minha história não é culpa minha, não é por minha causa. E não tem de ser o que define o meu futuro. Eu sou amável, eu mereço cuidado. E um vislumbre de luz faz toda a diferença.
Os vislumbres de luz dão-me esperança de que um dia o meu Verão chegue.

________________________________

“It would be impossible to fully understand the life and emotions of a child going through the foster care system, but this short narrative film portrays that saga in a poetic light, with brushes of fear, anger, sadness, and a tiny bit of hope.” - Santa Barbara Independent via

________________________________

Nota pessoal: O vídeo foi realizado para sensibilização sobre famílias de acolhimento, mas o que me interessa mesmo nele é a forma eficaz como nos deixa perceber o universo da criança que vive traumas, é retirada à família e entregue a estranhos. Nada mais consigo dizer, estou demasiado comovida.


Cipreste

Sem comentários: